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Pensadores Brasileiros - MANUEL FERRAZ DE CAMPOS SALES (1841-1913)

Entendo o termo “Governança” da forma sugerida pelo Banco Mundial: capacidade dos governos de planejar, formular e programar políticas e cumprir funções.[1] O governo de Manuel Ferraz de Campos Sales (1841-1913)[2] teve, como característica fundamental, ter deitado as bases do que seria o esquema de governança da República Velha, equacionando o grave problema da dívida externa, com um esquema de governo que garantisse, no Congresso, maioria favorável à Presidência da República, a partir de um pacto assinado com os governadores. Esse esquema se concretizava, mediante a ação de uma comissão de verificação de mandatos dos eleitos para o Congresso nos Estados, sob o rígido controle do governo da União.

As ideias republicanas foram assimiladas pelos nossos propagandistas de fins do século XIX, à sombra da concepção ensejada pela Terceira República Francesa (1870-1940). Em que pese o fato de tais ideias terem sido adotadas no seio de uma concepção liberal que se aproximava do radicalismo inglês (uma versão moderada que, professada pela maçonaria, teve entusiastas seguidores no nosso meio republicano), no entanto, havia uma inspiração positivista básica, que terminou polarizando o ideal republicano. Isso em decorrência do fato de que o comtismo tinha se ajustado à herança cientificista pombalina, reivindicada pelos primeiros propagandistas da República, aqueles que inspiraram as revoluções que tomaram conta do Brasil, no decorrer do Primeiro Reinado e do período regencial.

O Manifesto Republicano de Itu, de 1870, inseria-se nesse contexto, segundo Campos Sales. Se a palavra de ordem era a democracia, após a insurreição de inspiração socialista de 1848 na França, (e que teve desdobramentos em Pernambuco na mesma época), aquela deveria ser entendida não como construção de baixo para cima, a partir das comunas descritas por Tocqueville (1805-1859) em A democracia na América,[3] mas como imposição de cima para baixo, numa espécie de homogeneização do tecido social em torno ao centro do poder, à maneira napoleônica. Ora, para efetivar essa tarefa, a melhor ideologia seria o positivismo comtiano, partidário da denominada “ditadura científica”.

A propósito, Campos Sales escrevia, na sua obra principal, Da propaganda à presidência, destacando a influência positivista por ele recebida: “Continuava em grande atividade a agitação promovida pelos sinceros adeptos das novas ideias, na imprensa, na tribuna, nas conferências populares, nos clubes e até nas organizações secretas, havendo já a política radical adquirido vasta influência na opinião nacional, quando a proclamação da terceira república na França, coincidindo com este movimento que cada vez mais se propagava e atingia a todas as regiões do país, veio servir de forte estímulo a uma atitude de caráter mais acentuadamente democrático. É um fenômeno incontestável, pois que a história o atesta, o contágio das ideias entre os povos, nas épocas em que se operam os grandes abalos sociais. Já A. Comte (1798-1857) havia observado que, em cada momento da história, o povo, cuja evolução é mais adiantada, representa a humanidade inteira. O certo é que a Conjuração Mineira aparece no momento em que se opera a grande reação contra o antigo regime (...). Foi assim que, logicamente, apareceu, a 3 de dezembro de 1870, o Manifesto Republicano, documento memorável, que na história da democracia brasileira assinala o momento inicial da ação política, que se perpetuará, na memória do país, como o mais notável dos fastos das nossas lutas, tal a firmeza, a abnegação, a coragem dessa falange de heroicos combatentes, que a empreenderam e souberam leva-la a termo. A história deve este tributo de homenagem aos propagandistas da República”.[4]

A inspiração positivista de Campos Sales aparece bem clara num texto de 1888. Note-se, na página que citarei a seguir, como o autor apela para o expediente da Revolução (a revolução que devora o tempo e o espaço, escreve), quando se trata da derrubada da Monarquia. Mas trata-se de um expediente revolucionário que, paradoxalmente, deveria ser abolido da vida republicana. Todo o esforço de governança contido na “política dos governadores”, como veremos nas próximas páginas, girava em torno a esta proposta: banir a revolução da vida republicana, embora, mediante ela, tivesse sido instaurado tal regime. Eis o texto do nosso autor:

“As leis físicas constatam que, à aproximação dos terremotos, certos animais experimentam angústias extraordinárias, que são o aviso profético da iminência do acidente. São assim também as leis sociológicas em relação aos cataclismos do mundo moral. Há um pressentimento geral revelado pelo órgão de alguns, que denuncia a sua aproximação, indicando a sua marcha sinistra e ininterrupta. Eis positivamente o estado a que tem chegado a nação brasileira. Ao aproximar-se o advento do terceiro reinado, a consciência pública sente-se angustiada pelos pródromos de uma crise tão profunda como jamais fora sentida. (...) Para as situações como estas, só o grande e indisputável direito dos povos oprimidos, o processo sumaríssimo, pronto, rápido – a revolução que devora o tempo e o espaço, em busca da vitória! Mas, objetam os tímidos: Isabel acaba de ser vitoriada pelo povo e aclamada a Redentora. Sim; mas a história registra nos seus velhos e novos arquivos exemplos da popularidade de um dia, servindo de véspera ao infortúnio perpétuo (...)”.[5]

Assim concluía o nosso autor a síntese histórica sobre o advento da República: “Uma revolução popular elevou D. Pedro II ao trono brasileiro antes da época natural da sucessão; uma revolução parlamentar deu-lhe a investidura plena dos poderes majestáticos antes do tempo prefixado para a capacidade política e, finalmente, uma revolução republicana o derrubou do trono, banindo do Brasil a monarquia”.[6]

Desenvolverei neste artigo, em primeiro lugar, os aspectos fundamentais da proposta de governança republicana de Campos Sales, que passou a ser denominada de “política dos governadores”. Numa segunda parte, analisarei a crítica dos positivistas ilustrados à proposta de Campos Sales, na versão elaborada pelo seu irmão, Alberto Sales (1857-1904).

I – Aspectos fundamentais da proposta de governança republicana de Campos Sales, denominada de “política dos governadores”.

Três pontos desenvolverei nesta parte, correspondentes aos desafios herdados dos primeiros governos republicanos: em primeiro lugar, a superação da agitação revolucionária e do espírito de facção que tumultuaram os três primeiros mandatos de Deodoro da Fonseca (1889-1891), Floriano Peixoto (1891-1894) e Prudente de Morais (1894-1898); em segundo lugar, o equacionamento do problema da dívida externa do Brasil com os bancos europeus; em terceiro lugar, a superação da instabilidade da gestão republicana, mediante a prática da “continuidade administrativa” na denominada “política dos governadores”.

1 - A superação da agitação revolucionária e do espírito de facção que tumultuaram os três primeiros governos republicanos, nos mandatos de Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto e Prudente de Morais.

A passagem da Monarquia à República deu-se no meio a grande agitação, em decorrência do risco de as forças monarquistas tentarem reverter a mudança institucional, implantando de novo o Império. O caráter militar do golpe de 15 de Novembro de 1889 ensejou, no seio da sociedade brasileira, propostas bonapartistas, que visavam a dar continuidade à feição castrense do Governo Provisório presidido por Deodoro da Fonseca (1827-1892). Os erros de comando deste, aliados ao escancarado autoritarismo com que o seu sucessor, Floriano Peixoto (1839-1895) o Marechal de Ferro, sufocou as revoltas que acompanharam o fim do mandato deste, bem como o isolacionismo em que caiu o primeiro presidente civil, Prudente de Morais (1841-1902), ensejaram um clima de instabilidade que era necessário desmontar o quanto antes possível, a fim de garantir o reto funcionamento das instituições republicanas.

Esse era o clima refletido no alerta de Campos Sales em 1896, quando desempenhava o cargo de presidente do Estado de São Paulo. A respeito, escrevia o nosso autor: “Os elementos agitadores, que se aninham em nosso seio, comprometem-nos, pois que, à sombra da nossa condescendência, vão acarretando a nossa responsabilidade na sua ação, francamente e calculadamente anarquizadora. Isto nos enfraquece, porque nos desacredita, apresentando-nos como incapazes para o governo. Os últimos sucessos, se não produziram desastres, deverão servir-nos de advertência. Está claro que não podemos dirigir o elemento agitador e nem devemos presumir que ele chegue a subordinar-se à nossa direção. Ao contrário, os exaltados é que nos vão levando, a reboque nas suas arruaças, meetings de indignação, etc. Eles arranjam as crises, e nós aguentamos com as responsabilidades delas (...)”. [7]

A única atitude coerente que garantiria a estabilidade das instituições republicanas, pensava Campos Sales, seria a imposição de uma agenda positiva, tendente a deitar as bases para a estabilidade política, mediante a conquista de amplas maiorias no Congresso, favoráveis à instauração da continuidade administrativa. Essa proposta passava por uma exigência no contexto da dinâmica política: a criação de um partido conservador que construísse essa ampla maioria. Somente assim seria possível superar a agitação crescente das ruas, promovida, de dentro do Congresso, por deputados interessados em catalisar as instituições republicanas em benefício dos seus afilhados, excluindo o resto.

A fim de superar esse vulgar clientelismo, era necessário tomar a iniciativa e criar os mecanismos políticos para garantir a maioria no Parlamento e na opinião pública. Somente um trabalho de engenharia política que organizasse um partido conservador a serviço da estabilidade republicana, garantiria pleno sucesso para a consolidação das instituições. Campos Sales queixava-se de que inexistiam, na época, verdadeiros partidos políticos, que possibilitassem canalizar a opinião pública. Tratava-se, mais, de clientelas arregimentadas ao redor de figuras de prol. Mas faltavam a essas organizações um fundo doutrinário e uma proposta de ação.

Eis a proposta (contida em carta de Campos Sales endereçada a Bernardino de Campos) [8], que fazia referência às agitações de rua ocorridas na capital da República. O arrazoado do nosso autor tinha como pano de fundo a história da França republicana de então: “(...) Penso que temos a escolher: ou nos declaramos adversários e lhes damos combate decisivo, ou renunciamos à aspiração de formar um partido conservador, ordeiro, governamental e orgânico. Ficamos nisso que aí está, que é a anarquia, no meio da qual os nossos homens se vão perdendo por incapazes, e a desconfiança que se forma em torno de nós. Este é o elemento perverso em todas as democracias. Cassagnac[9] nunca encontrou melhor aliado do que Clemenceau,[10] o purista republicano, devorador de gabinetes. O que V. me conta do Rio é a reprodução no nosso país desta extravagância. Diga a Glicério [11] que um chefe não pode condescender em pontos fundamentais, sem enfraquecer a sua autoridade; e o chefe que se enfraquece está no risco de perder o comando, aliás impossível diante das vontades intransigentes. Basta de Câmaras agitadoras. Precisamos governar com ordem para governar bem (...)”. [12]

Elemento importante na instabilidade do período era o espírito bonapartista que tinha tomado conta do cenário político, ao ensejo das disputas em torno à indicação dos candidatos à Presidência da República. Eis o relato que fazia o nosso autor acerca da agitação ensejada pela revolta da Academia Militar, em Outubro de 1897. Destaquemos, antes, que os oficiais à testa do movimento eram favoráveis à candidatura de Floriano Peixoto para suceder a Prudente de Moraes.

“Os sucessos da Escola Militar – escrevia Campos Sales - tiveram larga repercussão no mundo político, onde foram acolhidos com a sofreguidão dos que apenas aguardam a superveniência do pretexto para um desenlace premeditado. Dir-se-ia, ao observar a presteza com que os grupos se separaram, alinhando-se em campos opostos, que no seio do Congresso tudo tinha sido predisposto, com ordem e disciplina, para que cada um tomasse o seu lugar ao primeiro sinal de combate. E quem estudasse atentamente a fisionomia das duas facções, veria reproduzido o mesmo aspecto político que apresentava a Câmara dos Deputados durante o governo do marechal Floriano, com uma só diferença: os oposicionistas de outrora arregimentavam-se então em torno do governo de Prudente de Morais, e declaravam-se oposicionistas os que se diziam representantes da tradição florianista. O nome do Marechal de Ferro, a toda hora evocado, chegou a ser um verdadeiro grito de guerra, sobretudo entre os elementos mais exaltados. Queriam estes ser os genuínos representantes do republicanismo brasileiro (...)”.[13]

A candidatura de Campos Sales apresentada pelo Partido Republicano Histórico visava a colocar um marco de continuidade institucional na nascente República que tivera, de forma excepcional, dois presidentes militares (Deodoro e Floriano), sucedidos por um presidente civil, Prudente de Moraes, indicado pelo fato de ter sido presidente da Assembleia Constituinte da República e que teve um mandato turbulento marcado pela pacificação do Rio Grande do Sul e a Guerra de Canudos. Ora, o único marco possível de continuidade doutrinária estava identificado com o Partido Republicano Histórico, representante de uma versão moderada de República, que se afastava ao mesmo tempo do bonapartismo e do autoritarismo que tinha ensejado as revoltas no Sul do Brasil, incentivadas pela versão heterodoxa do positivismo messiânico de Júlio de Castilhos (1860-1903).

Destacando o caráter moderado do programa de governo apresentado por Campos Sales e os vários cargos públicos por ele ocupados antes de chegar à presidência, escreveu o jornalista e senador Alcindo Guanabara (1865-1918): “O programa com que V. Exa. se apresentou às urnas não era de modo algum o da cisão; era o do Partido Republicano Histórico, era o programa que o propagandista, deputado provincial, o constituinte, o senador, o ministro da Justiça, o presidente de São Paulo havia sempre defendido e sustentado. O Sr. Campos Sales teve especial cuidado em o assinalar em termos inequívocos (...). Assim, a eleição do Sr. Campos Sales foi a primeira que se efetuou no Brasil em nome de princípios e de ideias definidas. Assegurada a ordem pública, a paz material e espiritual, o presidente pôde, com segurança e firmeza, executar o programa claro e definido, que na ordem financeira, como na ordem política, havia enunciado com precisão antes de ser investido do poder”.[14]

2 – Equacionamento do problema da dívida externa com os bancos europeus.

Eleito Campos Sales para o período 1898-1902, antes de tomar posse viajou para a Europa a fim de negociar, em Londres e Paris, novo prazo para a dívida externa, bem como empréstimos para fazer frente à penosa situação financeira do governo, que beirava o calote. Os conflitos constantes, a insegurança jurídica, as incertezas quanto à capacidade econômica do governo para honrar os seus compromissos com os bancos estrangeiros e para pagar o funcionalismo foram se avolumando de tal forma, que a má imagem internacional do país tinha se tornado uma carta negativa de apresentação.

O ministro plenipotenciário do Brasil em Paris revelava a difícil situação financeira decorrente da falta de uma política clara em matéria econômica. A respeito, o diplomata escrevia a Campos Sales em janeiro de 1898: “Uma das causas da nossa fraqueza em matéria de crédito é a ausência de plano financeiro ou a ignorância em que está a Europa de qualquer plano por parte do nosso governo”.[15]

O próprio Campos Sales escreveu acerca desse ponto: “(...) Nenhum plano estava assentado no sentido de debelar as excepcionais dificuldades que assediavam o Tesouro: apenas o Presidente da República, com quem estava de acordo o ministro da Fazenda, aludia a um grande empréstimo, sem lhe ocorrer talvez que, para um grande empréstimo, seria preciso, pelo menos, dispor de um grande crédito (...)”.[16]

O nosso autor viajou a Londres e Paris com autorização do presidente Prudente de Moraes para negociar com a banca internacional a rolagem das dívidas contraídas pelo Brasil no final do Império e nos nove anos transcorridos desde a proclamação da República e para que conseguir, também, um novo empréstimo que tirasse o país do aperto. Viajou acompanhado do jornalista Tobias Monteiro (1866-1952), que se desempenhou nessa missão como o seu secretário particular. [17] A dívida externa era vultosa e tinha sido acumulada a partir dos empréstimos feitos pelo Império para financiar a Guerra do Paraguai (1864-1870) e pela nascente República ao ensejo das emissões monetárias que acompanharam o Encilhamento (1889-1892), bem como pelos gastos correspondentes à manutenção da ordem pública com motivo dos levantes dos Estados do Sul, na Revolução Federalista (1893-1895).

Campos Sales ficou impressionado com o conhecimento que os banqueiros europeus tinham da situação econômica brasileira. O presidente do banco Crédit Lyonnais, em Paris, mostrou-lhe as estatísticas que a sua instituição tinha acerca das contas brasileiras. A respeito, escreveu o nosso autor: “No correr da visita que fizemos, ao entrarmos na repartição dos depósitos, disse-me ele: Aqui há valores suficientes para resgatar todo o papel moeda brasileiro, restando ainda grande sobra. Nem se suponha que haja nisto uma afirmação vaga, sem base. Na repartição respectiva teve ele ocasião, logo depois, de mostrar-me quadros estatísticos do estado financeiro e industrial de todas as nações do mundo, em que o Brasil figurava com uma exatidão irrepreensível. Fatos que ainda não estavam consignados no relatório da Fazenda já figuravam naqueles quadros. Não se entrega à exploração um ramal, um trecho qualquer de estrada de ferro, que não entre imediatamente para os seus mapas. Conhecem tanto, senão mais, da nossa vida, que nós mesmos. Devemos ter isto bem patente para não nos iludirmos acerca do que chamamos aqui campanha de difamação, no estrangeiro. O que faz a difamação são os nossos erros, que eles conhecem e cujos efeitos descontam”.[18]

O nosso autor achou que havia concordância entre o que pensava o presidente do Banco Crédit Lyonnais acerca da atitude que um bom governo deveria ter em matéria de gestão econômica e o que ele tinha dito no Rio de Janeiro, antes de partir para a sua viagem; efetivamente, Henri Germain, presidente do banco francês frisou: “É dever primordial de todo governo fazer executar o que for deliberado”. Campos Sales concordava com ele, lembrando o que tinha dito no Rio: “Este país do que precisa é de governo”.[19]

Em face da dívida externa, abriam-se três possibilidades: o calote, a redução arbitrária de juros ou a negociação de um grande empréstimo. Campos Sales descartava de entrada as duas primeiras soluções. A primeira, porque desmoralizaria ainda mais a já combalida imagem do Brasil no exterior, fechando as portas para futuras negociações. A segunda opção, no entender do nosso autor, era inconveniente, levando em consideração o que tinha acontecido com a Grécia. “(...) Tendo aquele país adotado esta solução para a crise que o afligia, foi obrigado mais tarde a sujeitar-se a uma fiscalização financeira internacional muito severa”, nas palavras do nosso autor. [20] Como se vê, os problemas financeiros da Grécia não são de hoje.

Restava a solução mais prudente, o reescalonamento da dívida e a busca de um novo empréstimo. A respeito dos termos da negociação que Campos Sales levou a cabo com os bancos internacionais em Londres e Paris, escreveu o nosso autor: “Do confronto da proposta original com o que foi aceito, depois de modificadas as cláusulas primitivas, resulta o seguinte: O prazo para pagamento dos juros em moeda, que era de dois anos, elevou-se a três; a amortização, que no fim do mesmo prazo (dois anos) deveria continuar a ser feita como na forma até então existente (...), foi espaçada para dez anos, depois do prazo acordado, isto é, ficou suspensa até 30 de junho de 1911. As garantias exigidas, compreendendo todas as alfândegas da União, a Estrada de Ferro Central e o serviço de abastecimento de água, ficaram reduzidas à especialização da Alfândega do Rio de Janeiro, devendo, porém, o governo suprir com as rendas de outras o que viesse a faltar no caso de insuficiência daquela (...)”.[21]

A negociação com os bancos internacionais deu-se entre o representante do governo brasileiro (Campos Sales) e os agentes do River Plate Bank, do London and River Plate Bank, do Brasilinanische Bank fü Deutschland e do Cédit Lyonnais, contando com a intermediação da Casa Rotschild, em Londres. Campos Sales considerava que a negociação tinha chegado a um bom termo, pelo fato de ter consultado duas variáveis: salvaguarda aos interesses dos bancos internacionais e, de outro lado, cálculo das possibilidades de o Brasil cumprir com o prometido.

Escrevia a respeito: “Ainda agora, após a consumação dos fatos, me convenço de que chegamos nesse acordo até onde podíamos chegar. Outros pensaram e pensam ainda, talvez, que deveríamos tentar melhor negócio. A questão, entretanto, não era positivamente a de um bom negócio, com maiores sacrifícios dos interesses dos nossos credores; era, sim, o de uma combinação honesta e exequível. Que esta que fizemos era honesta, prova-o o acolhimento da outra parte; que, também, era exequível, demonstra-o o próprio fato da sua execução”.[22]

Tratava-se, nessa complicada conjuntura por que passava a economia brasileira, de manter a credibilidade perante os credores da dívida externa sem, no entanto, paralisar a economia do país. Difícil tarefa de que o nosso autor se desincumbiu com desassombro, ao longo dos quatro anos do seu mandato como Presidente da República. Para o importante cargo de Ministro da Fazenda, Campos Sales escolheu Joaquim Murtinho (1848-1911) por encontrar nele a pessoa que poderia, com firmeza, sanear as contas públicas. No terreno da produção cafeeira, Murtinho acreditava, aliás, que o mercado se encarregaria de resolver o problema do abastecimento, sem que fosse necessária a intervenção do Estado. [23] As energias deveriam ser concentradas na racionalização do gasto público.

Eis os termos em que Campos Sales exprimia essa complexa realidade: “Com efeito, dada a profunda depreciação, do papel, a que chegamos, a primeira necessidade que ocorria era a de libertar o governo da contingência de tomar câmbio para o serviço da sua dívida externa, removendo, ao mesmo tempo, a principal causa do desequilíbrio orçamentário. Por outro lado, ganhava o governo largo período, de que aliás necessitava, para que pudesse, apoiado nestes recursos, estabelecer a ordem e a regularidade nas finanças e desenvolver gradativamente os trabalhos de valorização do meio circulante, causa fundamental da tremenda crise”.[24]

3 - A superação da instabilidade da gestão republicana, mediante a prática da “continuidade administrativa” na denominada “política dos governadores”.

A “política dos governadores”, posta em execução por Campos Sales ao longo do seu mandato presidencial (1898-1902), foi a resposta dada pelo mandatário à crônica instabilidade que caracterizou a primeira década republicana. O caminho escolhido pelo Presidente foi o da fundamentação do governo num amplo apoio dos governadores dos Estados, que garantiriam maioria para o governo no Parlamento, com vistas a tornar exequível a política econômica de rígido controle de gastos, a que se vira obrigado o país em decorrência da renegociação da dívida externa, cujos aspectos essenciais foram sintetizados anteriormente. A essa política o presidente da República dava o nome de manutenção da “continuidade administrativa”.[25]

Célio Debes (1926), um dos mais conceituados biógrafos de Campos Salles, identificava a “política dos governadores” como uma opção eminentemente pragmática, num meio em que inexistiam partidos políticos solidamente fundamentados do ângulo programático e doutrinário. A respeito frisa: “A política dos Estados, que, para seu escarmento, popularizou-se como política dos Governadores, tinha por fulcro sua concepção de partido político. Este devia concentrar correligionários e não cultivar alianças, porque a identidade de concepções tendia à permanência, enquanto as ligações de momento eram efêmeras, por natureza. Duas tinham sido, até então, e seriam, ainda por muito tempo, as correntes que se digladiavam nas unidades federadas. A que detinha as rédeas do poder e a que se lhe opunha. Era entre essas facções que o Chefe da Nação tinha que buscar suas bases políticas nos Estados. Inexistindo uma estrutura doutrinária que individuasse esses conglomerados, a opção seria obedecer a um critério objetivo. Assim, deu preferência aos contingentes que apoiavam os Governadores. O empenho destes, nas respectivas áreas, era manter a ordem e a ordem interna era a base fundamental para que a diretriz de governo de Campos Sales se concretizasse”.[26]

Segundo o historiador marxista Edgar Carone (1923-2003), Campos Sales pôs em prática um governo de índole conservadora, destinado a cumprir à risca a proposta de cortar gastos desnecessários, a fim de garantir os compromissos econômicos assumidos pelo governo anterior, quando da assinatura do Funding Loan, negociado na Europa por ele mesmo antes de tomar posse em 15 de Novembro de 1898. Mas o fato que fez deslanchar a “política dos governadores” foi constituído pelas brigas entre os dois principais agrupamentos políticos, Republicanos e Concentrados.

A respeito, frisa Carone: “As duplicatas e fraudes levariam a brigas internas, a divisões nos Estados, e o resultado seriam os problemas políticos superarem o interesse pela administração e pelas questões financeiras. Para remediar a situação, a seus olhos muito grave, Campos Sales entra em combinações com todos os governadores e lideranças políticas e modifica o mecanismo da Verificação de Poderes da Câmara dos Deputados. Essa tática resulta num controle geral dos Estados, daí ter sido denominada política dos governadores, ou, como o autor gosta de chama-la, política dos Estados”.[27]

Arsênio Corrêa[28], na sua obra intitulada: O pensamento político de Campos Sales destaca que a instabilidade crescente decorreu da ruptura ensejada com a queda do Império e o abandono das instituições do governo representativo no novo ciclo histórico. A isso se acrescentou a opção federativa, em termos bastante confusos. “A opção por uma república federativa, nos moldes americanos, – frisa este autor – levou o governo a adotar a teoria da descentralização. Portanto de uma prática organizacional de mais de meio século (...), saltamos no escuro para uma nova organização política e administrativa”.[29]

Como ministro da Justiça do Governo Provisório, Campos Sales tentou dar estabilidade à administração (presidida pelo velho Marechal Deodoro, bastante doente), mediante a tese da responsabilidade compartilhada do Chefe do Executivo e os seus ministros, nos atos de governo. No mandato de Prudente de Morais, que seguiu ao bonapartista governo de Floriano Peixoto, a instabilidade aumentou, na medida em que o Presidente da República ficou refém do Partido Republicano Federal, sendo que o chefe deste, nas palavras de José Maria Belo, tornou-se “uma espécie de condestável da República”. As instituições republicanas passaram a sofrer das mesmas contradições que enfrentou a Terceira República francesa: acirrada disputa entre o Executivo e o Parlamento, como destacava José Maria Belo (1885-1959): “O poder do Congresso e o poder do Presidente da República harmonizavam-se apenas nos artigos constitucionais; na realidade, não se entenderiam nunca”.[30]

Campos Sales considerava que a nova “política dos governadores” traria a estabilidade almejada. Essa política deveria ser traçada pelo Chefe do Executivo da União, tomando como base o exemplo do presidencialismo nos Estados Unidos da América. A respeito frisava: “Isso quer dizer que não é nos conselhos de ministros que se estabelece a unidade da administração, mas, sim, na intervenção oportuna e eficaz do presidente. É assim igualmente que se concilia a autoridade suprema deste com a autonomia dos seus auxiliares. Em suma, neste regime, não há no governo senão a política do presidente: o que cabe aos ministros é praticar lealmente esta política, para que se estabeleça a homogeneidade governativa”. [31]

Na negociação em torno à “política dos governadores” ficava clara a índole vertical da mesma: tratava-se no sentir de Campos Sales, de assunto a ser discutido não no Parlamento, mas num petit comitê de pessoas esclarecidas, reunidas ao redor do Presidente da República. Eis o que escrevia o nosso autor a respeito: “Os chefes que hoje aparecem nada dirigem: ao contrário, deixam-se arrastar mais ou menos constrangidamente pela impetuosidade de forças anárquicas, agremiadas em coletividades sem coesão. Não têm outro sentido as cenas do Congresso. É por isso que receio submeter a uma assembleia política a escolha do plano a ser adotado na verificação dos poderes da futura Câmara. Muitos quererão inspirar-se no sentimento partidário, outros alvitrarão pela liberdade de agir na conformidade das afeições pessoais e não faltará mesmo quem pense ser preferível a violência brutal do voto, porventura em eventual maioria para esmagar e eliminar por completo a outra parte. Que é que poderá sair de uma reunião assim agitada por intuitos e tendências tão desencontrados? Senão o desacordo, possivelmente um alvitre menos acertado, do qual poderá resultar o sacrifício do prestígio moral do Congresso”.[32]

Campos Sales culminava assim sua reflexão: “Parece-me, portanto, que mais acertado será evitar a reunião e sujeitar o exame dos meios práticos, para a execução do acordo, ao critério de alguns poucos, que sejam reconhecidamente mais competentes. Uma ação bem conduzida por parte destes será bastante para levar o acordo à sua completa execução, oferecendo seguras garantias aos que tiverem por si a legitimidade do voto”. [33] Afastava-se de vez, assim, o presidente Campos Sales da versão liberal de República definida por Tocqueville como sendo “o reino pacífico da maioria”.[34]

Tal estratégia de estabilidade deveria ter um perfil mais técnico (“administrativo”, dizia Campos Sales) do que político. Já assomava a ideia de “despolitizar” o governo, tornando-o mais uma gestão técnica a serviço da estabilidade econômica. Essa semântica anunciava o que viria mais tarde, com Getúlio afirmando que “o tempo das assembleias políticas já passou e era chegada a hora do equacionamento técnico dos problemas”, como frisava o líder gaúcho na Plataforma da Aliança Liberal.[35] 

O pacto de estabilidade almejado por Campos Sales foi mais obra do Presidente da República sobre o gabinete ministerial, bem como uma imposição dele e dos governadores (chamados então de presidentes) dos Estados, sobre o Poder Legislativo. O apoio dos governadores não era difícil, levando em consideração que os candidatos à presidência da República eram indicados a partir de prévio consenso dos executivos estaduais.

Campos Sales consultou diretamente os governadores dos Estados mais poderosos acerca do seu projeto: enviou correspondência prévia aos executivos estaduais da Bahia, Minas, São Paulo e Pernambuco. O nosso autor buscava firmar uma força de apoio forte no Congresso ao Governo da União, alicerçado, paradoxalmente, na defesa do princípio federativo contido no dístico: “Soberania local e Integridade da Pátria”.[36] Apesar da retórica oficial, subsistia o grande problema: como conciliar a defesa do princípio federativo com o abandono da defesa das liberdades locais, ao optar por fortalecer o poder do Presidente da República sobre o eleitorado das várias regiões? A Comissão de Verificação de Mandatos para o Congresso agiria em função dos interesses do Executivo nacional, deixando em segundo plano quaisquer outras considerações.

A verdade é que a questão da representação tinha sido relegada a segundo plano desde a proclamação da República. O mecanismo de dominação da Presidência e dos executivos estaduais sobre o Parlamento deu-se, de maneira pragmática, no terreno procedimental, ao redor do estabelecimento da Comissão de Verificação de Mandatos, criada na Mesa Diretiva do Congresso sob o controle do Executivo, sem mexer na Constituição. Embora tivesse sido conquistada uma estabilidade suficiente para pôr em execução a política de contenção de gastos adotada, esse expediente terminou gerando, contudo, grande instabilidade nos governos subsequentes, em decorrência do abandono dos interesses locais e regionais ensejada pela deformação dos pleitos eleitorais no contexto da “política dos governadores”. De outro lado, a questão do federalismo, que tinha sido levantada por Campos Sales junto com a da estruturação doutrinária dos Partidos, já desde a época da propaganda republicana, terminou desaguando num reforço paradoxal ao centralismo encerrado na prevalência dos interesses do Governo da União sobre as reivindicações regionais.[37]

Antônio Paim sintetizou assim a essência da via escolhida: “A peça-chave dessa política consistia em delegar à Mesa da Câmara, composta pela Chefia do Executivo, a atribuição de reconhecer os diplomas dos parlamentares. Às eleições concretas se substituía a ata da apuração, confeccionada na Capital da República a partir do único critério de assegurar maioria sólida ao governo, sem maiores compromissos com o evento real. Viu-se então representantes eleitos que perdiam seus votos na confecção da ata e toda sorte de chicana. Tudo isto mediante simples arranjo no Regimento da Câmara dos Deputados, intocada a Constituição”.[38]

Arsênio Corrêa caracterizou a “política dos governadores” como um expediente pragmático do governo para garantir a unidade política e a estabilidade, sem intervir diretamente nos Estados, mas manipulando o mecanismo de legitimação das eleições, privilegiando os interesses do Executivo e do Partido Republicano, ao seu serviço.

Eis a caracterização desse processo: “A política dos governadores foi, portanto, a unidade política estabelecida por Campos Sales, que pressupunha a não intervenção nos Estados. Isso trouxe a perda de importância das eleições, consolidando as situações estaduais, cuja legitimidade era equivalente à da União. É forçoso reconhecer que assegurou estabilidade política. Naturalmente, às custas da legitimidade da representação, vale dizer, do abandono do espírito que presidiu à estruturação das instituições de tal governo, no Segundo Reinado. Ali, o foco estava na determinação dos interesses que deveriam ser representados. E, subsequentemente, a avaliação sucessiva da capacidade respectiva de assegurar-lhe legitimidade. Agora o foco mudava completamente de direção: assegurar o livre exercício do poder, excluída a possibilidade de negociação fora dos círculos que tivessem comprovado sua fidelidade ao sistema republicano. Somente o Partido Republicano tinha autorização de funcionamento e, portanto, de participar dos pleitos em que era admitida a disputa”.[39]

O efeito produzido pelo arranjo autoritário foi a desvalorização da representação e a instabilidade, que conduziriam diretamente à adoção, mais adiante, do modelo de ditadura republicana criado por Castilhos no Rio Grande do Sul. Arsênio Corrêa ilustrou esses aspectos negativos da seguinte forma: “Os efeitos das novas regras estabelecidas no Regimento Interno da Câmara revelaram-se devastadores. A primeira vez em que se deu sua aplicação, em 1900, sob Campos Sales, (com a atuação da) Comissão instituída a partir da Mesa Cessante, deixaram de ser reconhecidos 74 mandatos, cerca de 35% do total (o Parlamento se compunha de 212 representantes). O caso extremo deu-se na Câmara eleita em 1912: 91 mandatos deixaram de ser reconhecidos, 43% do total. Criou-se, assim, uma falsa estabilidade, na medida em que exigia fosse desfigurada a representação. Ainda que a Constituição fosse mantida e submetidos ao Parlamento os frequentes estados de sítio, a providência tornou-se a antessala do longo ciclo autoritário vivido pela República brasileira”.[40]

A formulação da “política dos governadores” por Campos Sales alicerçava-se no democratismo rousseauniano, de que se tornou tributária a geração de jovens bacharéis formados no Largo de São Francisco, na segunda metade do século XIX. Campos Sales deixou-se seduzir pelo ideal da ordem imposta desde cima dos primeiros governos republicanos, nos quais assomava o caudilhismo militar, em que era muito rica, aliás, a tradição política hispano-americana, valorizada por ativistas como Quintino Bocaiúva, um dos mais atuantes propagandistas da República e que integrou, junto com Campos Sales, o gabinete do Governo Provisório presidido por Deodoro.

A “política dos governadores” com a manipulação dos resultados das eleições pela Mesa Diretiva do Congresso para garantir a estabilidade do governo, era uma nova encarnação da “vontade geral” concebida pelo filósofo genebrino. Estava esse expediente longe de permitir a representação de interesses dos indivíduos ao longo do território nacional, de acordo com os pressupostos do liberalismo clássico.

O democratismo rousseauniano foi, assim, a opção doutrinária privilegiada na República, em substituição às ideias liberais clássicas de Locke (1632-1704), Constant de Rebecque (1767-1830), Guizot (1787-1874), Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846) e Tocqueville, em que tinham se formatado as instituições imperiais. O abandono da questão da representação de interesses dos cidadãos era apenas o corolário dessa opção teórica.

Se bem é certo que a geração de Campos Sales dizia se inspirar na Terceira República francesa, (que tinha uma base ideológica bem menos estatizante que os ciclos republicanos anteriores, porquanto influenciada pelo liberalismo radical inglês), no entanto, no Brasil, por força da influência do positivismo, essa nuance foi mitigada, deixando-a mais próxima da ditadura republicana comtiana, aproximando a concepção republicana do modelo bonapartista. A concepção republicana dominante no terreno federal aproximou-se, assim, da visão de positivismo heterodoxo posta em prática por Castilhos no Rio Grande do Sul. Isso abriu espaço para que, em 1930, Getúlio Vargas implantasse em nível nacional o modelo castilhista.

A tese castilhista da “continuidade administrativa”, mediante a superação do debate político no legislativo (tendo sido convertido este em assembleia puramente orçamentária no Rio Grande do Sul) passou a formar parte do cardápio de medidas posto em marcha por Campos Sales no plano federal: o caminho estava trilhado para o advento da “ditadura científica”, com Getúlio, sob o viés do princípio apresentado na campanha eleitoral da Aliança Liberal em 1929, centralizada no slogan do “equacionamento técnico dos problemas”, defendido pela Segunda Geração Castilhista.[41]

II - A crítica dos positivistas ilustrados, na versão elaborada por Alberto Salles, à “política dos governadores” de Campos Sales.

João Alberto Salles (1857–1904)[42] acreditava na ação do espírito e na construção da ciência. Não era um filósofo. Era um político. Mas não ficou preso, apenas, à luta pelo poder e pela distribuição dos seus benefícios. Almejava construir uma República alicerçada nas luzes da ciência. Não se conformou com o positivismo de Comte (1798-1857) puro e simples. Procurou ampliar a visão da realidade política, abrindo o seu espírito aos autores que, sob o influxo do positivismo, tinham pensado na Europa as instituições republicanas. Nisso tudo radica a grandeza da obra de Alberto Salles.

Miguel Reale (1910-2006) destaca que Alberto Salles foi um cultivador do espírito positivo. “Mais do que a expressão específica de uma doutrina – pois nenhuma delas logrou sequer equiparar-se aos modelos europeus reproduzidos, - o que me parece mais importante foi a nova atitude que então se difundiu, condicionando o exame dos problemas nacionais, ou por outras palavras, foi mais o espírito positivo do que o positivismo; mais a atitude de reserva e de crítica que muitos assumiram, mesmo sem cuidarem especificamente de filosofia, do que a repetição dos ensinamentos de Haeckel ou de Spencer. Há muitos pontos ainda a esclarecer a propósito desse espírito positivo que animou a cultura brasileira a partir de 1870 e que foi bem mais relevante que o drama dos positivistas ortodoxos. Em verdade, sob certo prisma, Miguel Lemos e Teixeira Mendes representaram fatores negativos no movimento renovador de ideias. Por terem querido seguir A. Comte até às suas últimas consequências, aceitando com admirável devoção as suas ideias sociorreligiosas: coube-lhes, assim, o papel paradoxal de continuadores da velha tradição dogmática e autoritária, embora sob a roupagem da revolução científica, enquanto os adeptos do positivismo científico desempenhavam mais um papel de caráter crítico”.[43]

A respeito da inspiração ilustrada de Alberto Salles, escreveu Luiz Washington Vita: “Ideólogo acima de tudo, e ideólogo republicano particularmente. Alberto Salles lançou mão das ideias para a sua ação política. Seja como cientista social ou cientista político, seja como cientista do Direito ou cientista da educação, sua única meta foi, através das ideias, não apenas entender a realidade brasileira, mas transformá-la. Nisto se resume seu engagement e sua mensagem”.[44]

A transformação da realidade brasileira, segundo Alberto Salles, somente teria um caminho possível: a educação dos espíritos. Mais ciência, maior desenvolvimento do método científico aplicado à realidade brasileira no contexto do Direito e das Ciências Sociais, bem como no esforço em prol de construir instituições republicanas que correspondessem ao avanço do espírito humano: essa era a fórmula apregoada por ele. A República, segundo este autor, perdia o rumo, na medida em que faltava aos cidadãos ilustração para participarem a contento da vida do país. Alberto Salles esposava as teses de um positivista ilustrado inglês, John Stuart Mill (1806-1873).

Para o autor britânico, somente a ilustração dos espíritos permitiria às jovens nações a construção de instituições que garantissem a liberdade almejada. As suas teses eram uma síntese do que de melhor teve o comtismo (valorização do método científico e preocupação com os fundamentos morais das instituições políticas), com as teses básicas do liberalismo clássico (defesa das liberdades e construção dos mecanismos da representação). Alberto Salles empenhava todos os seus esforços na construção de uma síntese semelhante.

Ora, a política republicana representada pelo programa desenvolvido pelo seu irmão, Manuel Ferraz de Campos Sales e que se alicerçava na denominada “política dos governadores”, tinha um grave defeito: era fruto da negociação entre as oligarquias que tinham se apossado dos Estados brasileiros, a fim de manter intocado o poder no interior dos seus feudos, e transplantar essa “estabilidade” para o plano nacional, impedindo que representantes de outras tendências se elegessem para o Congresso.

Para Alberto Salles, essa era uma desavergonhada manutenção do status quo. O professor e idealista republicano achava que reduzir as conquistas do novo regime a essa proposta “conservadora”, consistia em trair os ideais republicanos pelos quais tinham se batido gerações de jovens nas últimas décadas do Império. Em decorrência disso, deixou estampada, em 1901, no jornal O Estado de S. Paulo (no artigo intitulado “Balanço Político”) a sua rejeição à “política dos governadores”, posta em prática pelo seu irmão com o apoio do Partido Republicano Paulista.[45] Decorria essa atitude da fidelidade inarredável aos princípios professados, afastando qualquer laivo de interesse imediato ou de conveniência política circunstancial.

No entanto, essa ruptura não significava o afastamento de Alberto Salles das atividades políticas. Estas eram entendidas no contexto mais amplo da “política republicana”, que consistia em “educar os espíritos” por todos os meios disponíveis: imprensa, panfleto, tribuna e pleitos eleitorais.

A respeito dessa política abrangente, escreveu Luís Washington Vita: “Nas páginas derradeiras da Política republicana, seguido a John Stuart Mill, para quem só se recomenda e se defende uma instituição ou uma forma de governo pondo em evidência todas as suas vantagens, afirma Alberto Salles que o primeiro dever dos republicanos brasileiros é fazer ativa e corajosamente a propaganda, recomendando, então, que diversos meios existem para o cumprimento desse dever: a imprensa, o panfleto, a tribuna e os pleitos eleitorais. Por qualquer deles é possível exercer sobre a mentalidade nacional uma ação verdadeiramente poderosa, no sentido da eliminação gradual dos preconceitos monárquicos”.[46]

Considerações finais.

A altiva atitude de Alberto Salles em prol da defesa de princípios e não de circunstâncias, talvez tenha pesado na reflexão que o seu irmão, Manuel Ferraz de Campos Sales, fazia anos depois, já fora do palco da política.

Escrevia o ex-presidente da República: “Sustentei outrora que as instituições reformam os costumes. Hoje reconheço que nutria uma quimera, e estou com aqueles que pensam que as mudanças sociais não se fazem a golpes de decretos. É certo, entretanto, que costumes e instituições exercem entre si influência recíproca, e isto adverte que o papel do legislador é o de observador atento dos fenômenos sociológicos que se vão desenrolando no seu meio, a fim de intervir oportunamente e com eficácia, ou seja para reprimir instintos perversos, ou seja para abrir caminho às expansões de sentimentos altruísticos. A sofreguidão reformista, às mais das vezes, não concorre senão para introduzir a anarquia na legislação. (...). Não destruí os partidos, porque eles não existiam, nem me preocupou a ideia da sua formação, porque não vi para isso os elementos que reputo indispensáveis. Os partidos políticos hão de aparecer naturalmente, logicamente, ao influxo dos princípios, quando, em lugar de falsos apóstolos, que exploram a credulidade popular e os sentimentos dos despeitados, entrar em campo uma legião de homens de crença, pregando com amor a doutrina da sua fé”.[47]

Tardia mas bela homenagem de Manuel Ferraz de Campos Sales ao seu irmão, “homem de crença” que pregava com amor a doutrina da sua fé. O ideal republicano sobreviveu à “política dos governadores” e à versão autoritária dos Castilhistas da segunda geração que, no longo ciclo getuliano, sagraram o princípio do “equacionamento técnico dos problemas” abolindo o debate político e a representação. Sobreviveu, também, à versão dirigista do duplo ideal “democracia e desenvolvimento”, formatada ao longo do ciclo militar e que fez frente, com desassombro, á dúbia alternativa da república sindical, ideológica e unidimensional dos tempos de João Goulart (1919-1976), no contexto polarizado da Guerra Fria.

Hoje, nas agruras da crise do “presidencialismo de coalisão” que agoniza e em que o Brasil se debate, os ideais republicanos sobrevivem na busca da consolidação de instituições que, mantendo a fé numa República para todos os brasileiros, tornem possível a estabilidade política e o progresso econômico, revitalizando as instituições do governo representativo e do controle moral ao poder.

Nesta quadra da nossa história, a herança dos irmãos Sales, gerada nos albores da República, talvez seja útil para orientar o debate atual. De Manuel Ferraz de Campos Sales podemos tirar a lição da escolha de uma política realista, de cunho aristotélico, no sentido de encontrar um caminho viável para a política ideal. Do irmão professor podemos tirar a inspiração platônica, de valorização de um ideal e de fidelidade ao mesmo. Da síntese de ambas as visões, talvez consigamos encontrar um meio termo (novamente de inspiração aristotélica), para descobrirmos o fio da meada do republicanismo, sem perdermos de vista as exigências concretas da realidade praticável.

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NOTAS 

[1] “Governança deriva do termo governo, e pode ter várias interpretações, dependendo do enfoque. Segundo o Banco Mundial, governança é a maneira pela qual o poder é exercido na administração dos recursos sociais e econômicos de um país visando o desenvolvimento, e a capacidade dos governos de planejar, formular e programar políticas e cumprir funções. Governança pode ser sinônimo de governo, o órgão de soberania ao qual cabe a condução política geral de um país, sendo o órgão superior da administração pública. No entanto, governança também pode dizer respeito às medidas adotadas pelo governo para governar o país em questão. São oito as principais características da boa governança: Estado de direito, transparência, responsabilidade, orientação por consenso, igualdade e inclusividade, efetividade e eficiência e prestação de contas”. In: http://www.significados.com.br/governanca/ [Consultado em 20/06/2015] 

[2] Manuel Ferraz de Campos Sales nasceu a 13 de fevereiro de 1841 em Campinas, SP, tendo falecido em Santos, SP, a 28 de junho de 1913. Formou-se advogado na Faculdade de Direito de São Paulo, em 1863. A sua vida política começou quando foi eleito deputado provincial. Tendo aderido ao movimento republicano em 1885, foi eleito para a Câmara dos Deputados. Desempenhou o cargo de ministro da Justiça no governo provisório da República, presidido por Deodoro da Fonseca. Foi eleito senador pelo Estado de S. Paulo (1891-1896), tendo desempenhado também a função de presidente desse Estado (1896-1897). Foi eleito presidente da República para o período 1898-1902. “Nesta função concebeu um mecanismo, através da simples reforma do Regimento da Câmara, prescindindo de reforma constitucional, que institucionalizou a prática autoritária no país, através do qual os governadores decidiam a sua composição, mediante o expediente do reconhecimento do mandato, e asseguravam maioria parlamentar ao Presidente da República, por eles indicado. A isto chamou-se de política dos governadores, que manteve relativa estabilidade política durante a República Velha” [CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO DO PENSAMENTO BRASILEIRO, Dicionário Bibliográfico de Autores Brasileiros, Brasília: Senado Federal, 1999, Biblioteca Básica Brasileira, p. 429]. Campos Sales, ao longo do seu mandato, saneou as finanças públicas, tendo restabelecido o crédito internacional bastante abalado pela instabilidade da primeira década republicana. 

[3] Cf. TOCQUEVILLE, Alexis de. A democracia na América. (Tradução e introdução de Neil Ribeiro da Silva). 1ª. Edição completa. Belo Horizonte: Itatiaia, 1977.

[4] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência, Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1983, p. 13.

[5] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência. Ob. cit., p. 28-29.

[6] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência. Ob. cit., p. 29.

[7] CAMPOS SALES, Manuel Feraz de. Da propaganda à presidência. Ob. cit., p. 72.

[8] Bernardino de Campos (1841-1915), fundador do Partido Republicano Paulista (PRP), desempenhou em duas oportunidades o cargo de Presidente do Estado de São Paulo. Foi Ministro da Fazenda do governo presidido por Prudente de Moraes.

[9] Paul Adolphe Granier de Cassagnac (1842-1904), jornalista e deputado bonapartista francês, crítico contundente do regime de liberdades adotado na 3 ª República francesa pelos republicanos radicais (ou moderados, influenciados pelo radicalismo liberal inglês). As suas acirradas críticas ajudaram a aumentar o ambiente de incerteza institucional e abriram o caminho para Clemenceau, “o devorador de gabinetes”.

[10] Georges Clemenceau (1841-1929) deputado radical da 3ª República francesa, foi também Senador e Presidente do Conselho de Ministros em duas oportunidades. Aproveitou o ambiente de incerteza causado pela ação crítica de Cassagnac, a fim de galgar o poder.

[11] Francisco Glicério de Cerqueira Leite (1846-1916). Jornalista e maçom, foi o único líder republicano paulista presente no golpe militar que derrubou a Monarquia em 15 de Novembro de 1889, ao lado de Quintino Bocaiúva (1836-1912) e Aristides Lobo (1838-1896). Senador pelo Estado de S. Paulo, organizou o Partido Republicano Federal (1894).

[12] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência. Ob. cit., p 72-73.

[13] CAMPOS SALES, Manuel Feraz de. Da propaganda à presidência. Ob. cit., p. 76-77.

[14] GUANABARA, Alcindo. A Presidência Campos Sales. (1902). Cit. por CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 85, nota 1. Existe edição atual da obra de Alcindo GUANABARA, A Presidência Campos Sales. (Brasília: Senado Federal, 2005, Coleção “Biblioteca Básica Brasileira”).

[15] Carta do Ministro plenipotenciário em Paris, Gabriel de Piza, a Campos Sales, 25 de janeiro de 1898. Cit. por CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência. Ob. cit., p. 88.

[16] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência. Ob. cit., p. 90.

[17] Cf. MONTEIRO, Tobias. O presidente Campos Sales na Europa. 2ª edição. Brasília: Edições do Senado Federal, 2005, vol. 40. Na Introdução a esta obra (p. 13-72), Tobias Monteiro traça um quadro bastante completo da difícil situação econômica encontrada por Campos Sales quando chegou à Presidência da República em 1898.

[18] CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 93-94.

[19] CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 93.

[20] CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 96.

[21] CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 100.

[22] CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., ibid.

[23] A respeito deste ponto, Antônio DELFIM NETTO frisa: "Convicto de que a intervenção oficial só poderia aumentar os nossos males, o governo deixou que a produção de café se reduzisse por seleção natural, determinando-se assim a liquidação e a eliminação dos que não tinham condições de vida, ficando ela nas mãos dos mais fortes e dos mais organizados para a luta". O problema do café no Brasil. São Paulo: UNESP, 2009, p. 45.

[24] CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 100.

[25] Ao longo da República Velha apareceram propostas de manutenção do “Poder Moderador” de feição não monárquica, a fim de superar os impasses ensejados pelo Executivo hipertrofiado. Essas tentativas, no entanto, fracassaram, abrindo o caminho para a aplicação da hipertrofia do Executivo pura e simples, na tradição da Segunda Geração Castilhista, com Getúlio Vargas à testa. Cf. a respeito do debate sobre o tema, CYRIL LYNCH, Christian Edward. “Entre a jurisdição constitucional e o estado de sítio: o fantasma do poder moderador no debate político-constitucional da Primeira República”. [in: https://www.academia.edu/12894652/O_fantasma_do_poder_moderador_no_debate_pol%C3%ADtico_da_Primeira_Rep%C3%BAblica] (Consultado em 05/07/2015). A respeito, frisa este autor: “O fracasso dessa tentativa de restabelecer o poder moderador, como meio termo entre judiciarismo e excepcionalidade, favoreceria a escalada autoritária que resultaria na instauração do Estado Novo”. Dentre as tentativas fracassadas, vale a pena lembrar a apresentada pelo ex-governador gaúcho Antônio Augusto BORGES DE MEDEIROS (1863-1961) na obra intitulada: O poder moderador na República presidencial. 2ª Edição. (Prefácios de Paulo BROSSARD DE SOUZA PINTO e Victor José FACCIONI) Porto Alegre / Caxias do Sul: Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul / EDUCS, 1993. Como destacou Antônio PAIM, a ditadura somente era admissível pelos seus beneficiários sendo que, quando na oposição, ex-ditadores como Borges de Medeiros preferiam a democracia, adotando até institutos da “metafísica liberal” como o “poder moderador”. Cf. PAIM, Antônio. A querela do estatismo – A natureza dos sistemas econômicos: o caso brasileiro. 2ª edição corrigida e acrescida. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994, p. 101 seg. “Capítulo V – O embate do século republicano e seu desfecho”.

[26] DEBES, Célio. Campos Sales, perfil de um estadista. Rio de Janeiro / Brasília: Livraria Francisco Alves / Instituto Nacional do Livro, 1978, 1 º volume, p. 15.

[27] CARONE, Edgard. A República Velha – Instituições e classes sociais. 2ª edição revista e aumentada. São Paulo: DIFEL, 1972, p. 305.

[28] Arsênio Eduardo CORRÊA (1945), pesquisador do Instituto de Humanidades, advogado, tem centrado a sua obra na pesquisa do substrato doutrinário da República, tanto no que se refere aos primórdios, quanto no relativo ao último período, após o ciclo militar, correspondente à abertura democrática. Além da obra dedicada ao estudo da vida e pensamento de Campos Sales (O pensamento político de Campos Sales, Londrina: Edições Humanidades, 2009), publicou também: A Frente Liberal e a democracia no Brasil – 1984-1985, (São Paulo: Nobel, 2006).

[29] CORRÊA, Arsênio. O pensamento político de Campos Sales. Ob. cit., p. 16.

[30] BELO, José Maria. História da República, 6ª edição, São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1969, p. 151.

[31] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 108.

[32] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 124.

[33] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 125.

[34] TOCQUEVILLE , Alexis de. A democracia na América. (Trad. de J. A. G. Albuquerque). São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. 266-267. Coleção “Os Pensadores”.

[35] VARGAS, Getúlio Dornelles e outros. Aliança Liberal: Documentos da campanha presidencial. (Introdução de Ricardo Vélez Rodríguez, “Tradição centralista e Aliança Liberal”). 2ª edição, organizada por Ricardo Vélez Rodríguez. Brasília: Câmara dos Deputados, 1982. A Introdução encontra-se nas págs. 9 a 43.

[36] CAMPOS SALES, Da propaganda à presidência, ob. cit., p. 131-132.

[37] Para a discussão acerca do federalismo no pensamento de Campos Sales, cf. SILVEIRA, Rosa Maria Godoy. Republicanismo e federalismo 1889-1902. Um estudo da implantação da República no Brasil. (Apresentação de Petrônio Portella). Brasília: Senado Federal, 1978.

[38] PAIM, Antônio. A querela do estatismo, 1ª edição, Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978, p. 62.

[39] CORRÊA, Arsênio. O pensamento político de Campos Sales. Ob. cit., p. 61.

[40] CORRÊA, Arsênio. O pensamento político de Campos Sales. Ob. cit., ibid.

[41] Cf. nossa obra: Castilhismo, uma filosofia da República, (apresentação de Antônio Paim), 2ª edição, Brasília: Senado Federal, 2000, Coleção Brasil 500 anos, pg. 252-258.

[42] João Alberto Sales nasceu em Campinas, São Paulo (1857), tendo falecido em Salto, interior de S. Paulo (1904). Formou-se em Direito na Faculdade do Largo de São Francisco, em São Paulo, em 1882, após ter tentado estudar engenharia nos Estados Unidos. Participou ativamente da política no Partido Republicano Paulista, como jornalista e deputado federal. Rompeu com o Partido em 1894 e em 1901 com o seu irmão, Manuel Ferraz de Campos Salles então presidente da República, em decorrência dos traços clientelistas de que se revestiu a denominada “Política dos Governadores”, concebida e posta em prática pelo seu irmão e que constituiu, no entender do nosso autor, um dos mais sérios golpes contra a representação política. Em matéria de positivismo, Alberto Salles optou por uma concepção moderada, assumindo algumas teses de John Stuart Mill (1806-1873), como, por exemplo, a defesa do governo representativo. Após a sua saída da política dedicou-se ao magistério. Deixou ampla obra escrita, podendo ser mencionados os seguintes livros: Política republicana (1882), Catecismo republicano (1885), Ensaio sobre a moderna concepção do Direito (1885), A vitória republicana (1885), Os crimes célebres de São Paulo (1886), A pátria paulista (1887), Estudo científico sobre disciplina e organização partidária (1888), Ciência política (1891) e O ensino público (1901).

[43] REALE, Miguel, Filosofia em São Paulo. São Paulo: Conselho Estadual de Cultura, 1962, pg. 23-25. Cit. por VITA, Luiz Washington. Alberto Salles, ideólogo da República. São Paulo: Companhia Editora Nacional / EDUSP, 1965, p. 14-15. Os autores citados por Miguel Reale são: Ernst Haeckel (1834-1919) médico e naturalista alemão que popularizou o princípio de que a ontogenia é uma recapitulação da filogenia. Herbert Spencer (1834-1919) filósofo inglês, que alargou o conceito darwinista de evolução, aplicando-o às organizações sociais, tendo dado ensejo, no Brasil, à corrente denominada de “darwinismo social”. Miguel Lemos (1854-1917) e Raimundo Teixeira Mendes (1855-1927) positivistas brasileiros que organizaram, no Rio de Janeiro, o Apostolado e a Igreja Positivista, tendo permanecido fiéis à “religião da humanidade” proposta por Comte na última parte da sua obra.

[44] VITA, Luiz Washington. Alberto Salles, ideólogo da República. Ob. cit., p. 21.

[45] Cf. “Cronologia de Alberto Sales”, in: VITA, Luís Washington. Alberto Sales ideólogo da República. Ob. cit., pg. II-III.

[46] VITA, Luís Washington. Alberto Sales ideólogo da República. Ob. cit., p. 80.

[47] CAMPOS SALES, Manuel Ferraz de. Da propaganda à presidência. Ob. cit., p. 131-132.