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PARADOXOS ELEITORAIS: O VOTO PROPORCIONAL IMPEDE A ADEQUADA REPRESENTAÇÃO

PARADOXOS ELEITORAIS: O VOTO PROPORCIONAL IMPEDE A ADEQUADA REPRESENTAÇÃO

O VOTO DISTRITAL, NO CANADÁ, APROXIMA O CIDADÃO DOS DEPUTADOS QUE ELEGE

Os meus irmãos, há mais de vinte anos emigraram da Colômbia para o Canadá e observo como funcionam ali aquelas variáveis que compõem o quadro das nossas vivências do dia a dia: os planos de saúde, bem como a educação pública, as políticas de segurança, etc., enfim, aquilo que interessa ao cidadão comum.

Nesse país, no que tange à saúde, por exemplo, há atendimento gratuito e de excelente qualidade para todos, incluídos os custos dos medicamentos. Idem no terreno educacional, especialmente nos níveis básico e fundamental. Quanto à segurança, pode-se andar, com tranquilidade, em qualquer horário, pela rua, sem o temor de ser assaltado. Por que essa diferença gritante do belo país do Norte em relação ao Brasil, no que tange às variáveis que mais de perto tocam a nossa qualidade de vida, como serviços de saúde de qualidade para todos, educação de primeiro mundo nos vários níveis e segurança pública?

A diferença entre esse país e o Brasil é que no Canadá há, verdadeiramente. representação dos interesses dos cidadãos no Parlamento, observando-se, regularmente, a rotatividade no poder (o modelo parlamentarista funciona muito bem). É comum observar o comportamento dos deputados ao longo do ano: visitam, rotineiramente, o seu reduto eleitoral, a fim de prestar contas da sua gestão aos eleitores. Como o voto é distrital, quem não comparecer regularmente no seu distrito para falar com os distintos eleitores, perde a vaga parlamentar na seguinte eleição.

Da última vez que estive passando férias em Toronto, onde os meus irmãos residem, observei que a representação realmente funciona para os aproximadamente 30 milhões de canadenses. Um exemplo: em julho de 2018 debatia-se a questão da educação de gênero impulsionada pelos socialistas no poder, presididos pelo primeiro-ministro Trudeau (ou “Trudeauzinho”, como é chamado o filho do célebre Primeiro-Ministro socialista dos anos 70). Mas as leis que impunham esse modelo, votadas pelo Parlamento federal foram, uma a uma, caindo nos parlamentos regionais, inclusive com a eleição de primeiros-ministros conservadores nas principais Províncias (correspondentes aos nossos estados), como se observou nas de Toronto e Quebec, duas das mais poderosas regiões políticas desse belo país.

O voto do cidadão pesa e é valorizado. Testemunhei isso recentemente. O meu irmão estava hospitalizado e, num dia de eleição, conversava com ele ao telefone. A atendente pediu-me, gentilmente, que ligasse meia hora mais tarde, pois acabava de chegar o representante do escritório eleitoral, a fim de colher o voto do meu irmão. Falando, depois, com ele, contou-me que é rotina os funcionários do escritório eleitoral irem aos hospitais, nos dias de eleição, a fim de colherem os votos dos pacientes internados. A mensagem deixada pelo governo é clara: o seu voto, mesmo que você esteja doente, é importante.

No Brasil, é urgente que a reforma política avance, a fim de conferir ao voto do cidadão o valor que merece. Acontece que, quando foi debatida a questão do voto distrital na Assembleia Constituinte, em 87, a adoção dessa modalidade de voto, que gozava de aprovação pela maioria dos participantes da Comissão de Constituição e Justiça, presidida pelo saudoso senador José Richa (um dos fundadores do PSDB), foi sabotada pelo também senador Mário Covas, colega de Richa. Isso por motivos pessoais: não interessava a Covas a adoção do voto distrital, quando ele se beneficiava largamente com o voto proporcional, a partir da sua base eleitoral, o Porto de Santos. Não foi votada a aprovação do voto distrital na Comissão de Constituição e Justiça, não tendo sido aprovada no Plenário.

Conclusão: o voto proporcional continuou sendo praticado, como até agora, com a distorção da representação. Hoje acontece que os “puxadores de voto” conseguem “eleger” pela matemática maluca que prevaleceu nas eleições proporcionais, figuras que não foram escolhidas pelos eleitores. Aí radica a nossa falta de representação, reforçada pela nociva herança deixada pelo “Pacote de Abril” (1977) do general Ernesto Geisel, que desfigurou a representação, conferindo mais peso proporcional no número de deputados eleitos, aos Estados mais atrasados da Federação, dependentes dos favores da União. Ora, essa desproporção, infelizmente, ainda persiste!

Se tivéssemos voto distrital, com certeza o cidadão comum se sentiria representado e o apoio da opinião pública ao Parlamento seria um fato. Num impasse como o que estamos vivendo, de confronto entre os poderes públicos, quem resolveria a questão seria, simplesmente, a maioria parlamentar. O Brasil perdeu, aliás, com a República, a sadia prática do Parlamentarismo, que muito nos ajudaria a desmontar as crises sucessivas pelas que tem passado o nosso Modelo Presidencialista, ao logo do ciclo republicano. Que fique o lembrete para a próxima reforma política, a fim de valorizarmos, de fato, a representação: adoção do voto distrital já!