Este ensaio recolhe as pesquisas realizadas sobre os Escritos dos Santos Padres, ao ensejo dos estudos feitos por mim no Seminário Conciliar de Bogotá, entre 1965 e 1968, no Curso de Teologia, sob a orientação do Pe. Alfred Morin (1926-2017). Na Biblioteca da mencionada instituição tive oportunidade de consultar a rica bibliografia ali conservada, sobre as origens do Cristianismo e a história dos primeiros séculos da Igreja. O ensino dos sacerdotes sulpicianos, congregação à qual pertencia o padre Morin, valorizava sobremaneira os estudos bíblicos. Os docentes das disciplinas ligadas ao estudo das Sagradas Escrituras tinham se especializado na famosa Escola Bíblica de Jerusalém, sendo que, ao lado da Biblioteca, foi organizado por eles um riquíssimo Museu de Arqueologia Bíblica, cujo acervo foi zelosamente conservado até hoje.
Quando da minha passagem pelo MEC, como Ministro, realizei contatos com a Escola Bíblica de Jerusalém, com o apoio do embaixador de Israel em Brasília, Yossi Shelley, para assinar um convênio de intercâmbio entre essa renomada instituição e Faculdades de Teologia sediadas no nosso país. Infelizmente, com a minha saída do Ministério essas negociações não prosperaram. Espero que, futuramente, uma iniciativa semelhante seja retomada pelo Ministério, para benefício da pesquisa e da docência da Teologia Bíblica nos centros de estudos dedicados a essa disciplina no nosso país.
Os escritos dos Santos Padres recolhem a tradição das primeiras comunidades cristãs, que rapidamente se disseminaram ao longo do Império Romano nos três primeiros séculos da nossa era. Os idiomas em que foram vertidas as primeiras obras que davam conta da vida dessas comunidades eram o grego, na versão popular conhecida como koiné, o latim e o ciríaco. Um traço sobressai nessas obras: a cálida transmissão da experiência vivida no seio dessas comunidades, ao ensejo do denominado querigma, que constituía o cerne da experiência cristã. Essa mensagem se centrava num fato: a pregação da ressurreição de Cristo e da vida eterna por Ele prometida aos seus fiéis seguidores. Ora, a vida dessas comunidades primitivas passava a girar ao redor dessa experiência nova, que recolhia, sem dúvida, as expectativas que, no mundo Antigo, outras religiões já anunciavam de forma vaga, mas certeira, notadamente nas religiões do Antigo Egito, para não falar da esperança da vida futura nas antigas comunidades judaicas, que proliferaram ao redor do Mediterrâneo, desde as costas da Palestina e Israel até as Colunas de Hércules, na longínqua Espanha.
Contrapondo essa experiência que poderíamos chamar de “globalização” religiosa com a das comunicações instantâneas via redes de hoje, podemos destacar um aspecto que nos pareceria estranho. A relativa tolerância com que a experiência religiosa cristã era recebida no Mundo Antigo, no seio das diversas sociedades. Os leitores acharão estranha essa minha afirmação e perguntar-me-ão: e as perseguições de que foram vítimas os cristãos nos primeiros séculos? É claro que houve momentos em que tais manifestações de intolerância levaram à morte milhares de cristãos. Mas não foi esse, unicamente, o clima geral que acompanhou a pregação do Cristianismo ao longo dos primeiros séculos.
A mensagem cristã, muitas vezes, ocupava o espaço de uma novidade que as pessoas tinham curiosidade em conhecer, como foi, por exemplo, a circunstância da pregação feita pelo Apóstolo Paulo em Atenas, no Areópago. O grande Pregador do Cristianismo parou em frente ao altar dedicado “Ao Deus desconhecido” (tò agnosto Theó) e, a partir daí, pregou a mensagem evangélica da morte e ressurreição de Jesus. Diferia, pois, muito o intercâmbio de vivências religiosas no Mundo Antigo, do fenômeno contemporâneo de “lacração” de todo aquele que pensar diferente. Nos tempos iniciais do Cristianismo, havia pelo menos curiosidade em escutar uma pregação que prometia a vida eterna.
A mensagem dos Santos Padres e as suas “Apologias” do Cristianismo caracterizam-se como um colocar em conhecimento dos outros o cerne de uma mensagem nova, que promete uma renovação da existência e que deságua na Eternidade. Santos pregadores chegam até a se dirigir ao Imperador de plantão para lhe dar a conhecer o “querigma” primitivo, da morte e ressurreição de Jesus, de forma semelhante a como o Divino Mestre, nos Evangelhos, aparece pregando o Reino de Deus até às autoridades romanas, como no caso do Centurião de Cafarnaum.
O Cristianismo é apresentado, por muitos pregadores dos primeiros séculos impregnados de helenismo, como “uma filosofia” de vida, diferente das filosofias em voga como o epicurismo ou o estoicismo, justamente na medida em que promete uma renovação existencial completa, que se perpetua na Eternidade.
Desenvolverei, neste texto, seis pontos: I – Policarpo de Esmirna (70-156). II – Papías de Hierápolis (170-163). III – A Instrução dos Apóstolos ou Didaqué. IV – O Pastor de Hermas. V – Apologistas gregos do século II. VI – Apologistas gregos e latinos do século III.
I – POLICARPO DE ESMIRNA (70-156).
São Policarpo de Esmirna foi a última testemunha da era apostólica. Sentava-se aos pés de São João evangelista (10-103) para ouvir falar de Jesus e foi sagrado bispo de Esmirna pelo mesmo Apóstolo, antes dos 40 anos de idade. Frisa Tertuliano (160-220) a respeito: “Numerosos discípulos se aglomeravam em torno dele para ouvir dos seus lábios o último eco vivente da palavra apostólica”.
No ano de 155, sendo Papa Aniceto (92-168), Policarpo teve de ir a Roma para tratar com o pontífice uma questão então discutida. Tratava-se de saber se, como o Papa frisava, a Páscoa deveria ser celebrada no dia domingo como tinha sido feito pelos seus predecessores, ou se deveria ser comemorada no dia 14 do mês de Nissan, como ensinava Policarpo. Nenhum dos dois cedeu um milímetro, fato que, no entanto, não produziu nenhuma diminuição da amizade entre os dois. Em Roma, Policarpo encontrou o hereje Marcião de Sinope (85-160), que lhe perguntou: “reconheces-me?” Policarpo respondeu: “Claro que sim, você é o primogénito de Satanás”.
Depois do seu regresso de Roma, Policarpo foi preso, acusado de ser cristão, tendo sido queimado vivo no estádio de Esmirna, no sábado 26 de fevereiro do ano 156. Como as chamas não o atingissem, recebeu um golpe de estilete e o seu corpo foi calcinado. Tinha então 86 anos de idade.
As Atas do seu martírio são as primeiras que se conhecem dos mártires cristãos, possuindo, por isso, uma importância capital. Nelas, aparece já a ideia de que o martírio é uma imitação de Cristo. O documento aporta, também, a prova mais antiga do culto aos mártires, considerando o martírio um natalício para o Céu. As seguintes palavras são definitivas: “Adoramos a Cristo como Filho de Deus que é; mas aos mártires tributamos, com toda justiça, a homenagem do nosso afeto, como a discípulos e imitadores do Senhor, pelo amor insuperável que mostraram ao seu Rei e Mestre”.
Esse é, pois, o fim intrínseco e o caráter dogmático da veneração dos Mártires. A oração que as Atas colocam em boca de Policarpo, quando vai morrer, é de grande importância, pois recorda as fórmulas litúrgicas em uso, com uma estrutura trinitária. Como a comunidade de Filipos pedisse a Policarpo uma cópia das Cartas de Santo Inácio de Antioquia (que foi bispo de Antioquia da Síria entre 68 e 100), ele as enviou juntando uma carta do próprio punho.
A denominada Carta aos Filipenses constitui uma exortação moral muito semelhante à dirigida por São Clemente de Alexandria aos Coríntios, da qual certamente Policarpo tomou a sua inspiração. Nela denuncia o arquiheresiarca Marcião e se defende com palavras que lembram as Cartas de São João acerca da doutrina de que o Verbo se encarnou em Cristo e morreu na cruz. Na Carta aos Filipenses é exposta a doutrina, a organização e a caridade cristã da Igreja daquele tempo. A Igreja de Filipos era governada por uma comissão de presbíteros; é recomendada a prática da esmola, bem como uma conduta irreprochável no meio dos Gentios e a oração pelas autoridades civis.
II – PAPÍAS DE HIERÁPOLIS (70-163).
Não se sabe, com certeza, se Papías foi discípulo do apóstolo São João. É certo, no entanto, que ele tinha conversado com os discípulos imediatos dos Apóstolos e que pertencia à terceira geração cristã. Chegou a ser sagrado bispo de Hierápolis, na Asia Menor. Em que pese o fato de Eusébio de Cesareia (265-339), conhecido como pai da História da Igreja, afirmar que era de inteligência medíocre, escreveu a obra intitulada: Explicação das sentenças do Senhor, em cinco livros. Defendeu o milenarismo (doutrina que sustentava que transcorreriam mil anos após a ressurreição dos mortos). Apesar dos seus defeitos, a obra possui grande valor, pois conserva o ensino oral dos discípulos dos Apóstolos. Dele temos a maior prova de que o Evangelho de São Marcos (12-68) é canónico. Da mesma forma, por ele sabemos que o evangelista Mateus (falecido provavelmente em 72) escreveu em hebraico, embora em tempos de Papías já tinha sido substituída essa versão pela tradução grega.
III – A INSTRUÇÃO DOS APÓSTOLOS OU DIDACHÉ.
Este documento, bastante conhecido na Antiguidade, foi encontrado em 1875. Ainda hoje não se conhecem com certeza as suas origens, bem como a data da publicação, o autor e o país em que foi escrito. O título autêntico do documento parece ser, em grego: Didachai ton Apostolon (Instrução dos Apóstolos) ou também: Didaché tou Kúriou diá ton dódeka Apostolón tois néosin (Instrução do Senhor por intermédio dos doze Apóstolos aos Gentios).
A sua importância (às vezes a obra foi considerada como revelada por Deus) é testemunhada por Clemente de Alexandria (150-215), Orígenes (185-253), Eusébio de Cesareia (265-339) e Atanásio de Alexandria (296-373). A Didaché foi composta, muito provavelmente, na Síria, antes do ano 100, sendo desconhecido o seu autor. É o documento mais importante da era pós-apostólica e a fonte mais antiga que se conhece acerca da legislação da Igreja.
A intenção do autor consistiu em fazer um breve resumo da doutrina de Cristo, tal como foi ensinada pelos Apóstolos. Não é um simples manual de instrução para os catecúmenos ou de tipo litúrgico, mas um compêndio dos preceitos morais e instruções acerca da organização das comunidades e de disposições regulamentares relativas às funções litúrgicas. Com a Didaché começa o direito canónico do Oriente e do Ocidente.
A obra consta de 16 capítulos divididos em duas partes essenciais: do 1º ao 10º capítulos são expostas instruções em relação à liturgia. Do 10º ao 15º são enunciadas normas disciplinares. A obra conclui com o 16º capítulo que versa sobre a parusia do Senhor e os deveres dos cristãos em face dela. É ensinado que existem dois caminhos: o do bem e odo mal. A teoria dos dois caminhos já era ensinada no contexto da instrução para os prosélitos nas sinagogas helenísticas. Tratava-se de uma concepção grega conhecida desde a antiguidade. O caminho do bem é encontrado na caridade em relação a Deus e ao próximo. Nos capítulos 7 a 10 é explicada a liturgia do batismo. “Batizai em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, com água viva ou com outra água, bem seja por imersão ou por infusão se não houver água viva". Ordena-se, explicitamente, o jejum às quartas e sextas, diferentemente da prática judaica que prescrevia o jejum às segundas e quintas. O jejum é prescrito antes do Batismo, para o batizante e o batizado. A recitação da oração dominical é obrigatória para os fiéis três vezes ao dia.
A Didaché contém, de outro lado, nos capítulos 9 a 10, as preces eucarísticas mais antigas que chegaram até nós, como o cânone da Missa e as orações após a comunhão. A Eucaristia é, segundo a Didaché, "pneumatiké trofé kaì póton", ou seja, manjar e bebida espiritual.
Em relação à prática da Confissão, o documento prescreve que deve ser feita antes de receber a Eucaristia, pois “somente aquele que for santo pode-se aproximar dela. Aquele que não for, que faça penitência”. Tratava-se de uma confissão litúrgica, semelhante à que se pratica hoje na Igreja Católica.
Quanto à Hierarquia, a Didaché frisa que os bispos e diáconos são os chefes da comunidade, mas não se sabe se os primeiros eram simples sacerdotes ou bispos. Existem, também, os Profetas, cujo rango é tido em muita estima, pois não podiam ser julgados, em virtude de que “eles são os nossos sumos sacerdotes”. Podiam celebrar a sagrada eucaristia e lhes eram oferecidas as primícias.
A esmola é aconselhada, mas destaca-se, também, que existe a obrigação de ganhar a vida com o seu trabalho. Recomendava-se “que não viva entre vós nenhum cristão ocioso pois, do contrário, é um traficante de Cristo”. A Igreja é, segundo a Didaché, “não somente a reunião dos crentes em oração, mas também o novo Povo ou a nova Raça dos Cristãos, que algum dia estabelecer-se-ão firmemente no Reino de Deus. A Igreja é uma e santa. O documento frisa a respeito: “Como este fragmento (de pão) estava disperso sobre os montes e reunido se fez um (a eucaristia), assim seja reunida a Igreja dos confins da terra no teu Reino. Lembra-te, Senhor, da tua Igreja, para libertá-la de todo mal e torná-la perfeita em teu amor”.
Uma palavra sobre a “Escatologia”. A expressão aramaica “Maram atha” (“Vinde, Senhor”) é a aspiração que anima toda a obra. O sentido escatológico aparece muitas vezes nas prezes eucarísticas: “Que venha a graça e que passe este mundo”. Esta expressão aparece em muitas outras partes da obra.
IV – O PASTOR DE HERMAS.
Duas figuras celestes fizeram revelações a Hermas: uma mulher de idade avançada, venerável matrona (representação da Igreja) e um anjo em forma de pastor, que deveria guiar a cristandade em direção à bem-aventurança, por meio da penitência. O livro pertence ao gênero dos apocalipses apócrifos.
1 – Fontes e temática geral da obra.
No Cânone de Muratori lê-se o seguinte: “Muito recentemente (por volta do ano 200), nos nossos tempos, na cidade de Roma, Hermas escreveu O Pastor, sendo bispo da cidade de Roma Pio, o seu irmão”. De outro lado, no livro há uma alusão ao Papa Clemente I (35-100), conhecido como Clemente Romano, que parece situar a redação da obra nessa época, elaborada numa recopilação progressiva. Assim, as partes mais antigas da obra parecem ser do tempo do mencionado pontífice, enquanto a redação definitiva situa-se no pontificado de Pío I (140-150).
O autor, Hermas, é um cristão de origem judaica, comerciante e agricultor, que tinha sido vendido como escravo e levado a Roma. Durante a persecução desatada contra os cristãos, teve de sofrer a apostasia de seus filhos e a falta de prudência da sua mulher, nas suas falas. Por força da perseguição perdeu os seus bens, o que contribuiu para torná-lo um cristão mais fervoroso. Depois aconteceram as revelações que ele conta, constituindo o seu relato mais um tratado sobre a eficácia da penitência, dividido em três seções e cinco visões acompanhadas de dez comparações. É bem provável que Hermas fosse sacerdote, porta-voz dos Presbíteros romanos de então. Sem ser um grande teólogo ou erudito, é um excelente moralista.
O seu ensinamento é que a moral cristã se resume em 12 mandamentos, que o autor enumera da seguinte forma: “1º mandamento: manter a fé; 2º mandamento: simplicidade; 3º mandamento: veracidade; 4º mandamento: pureza; 5º mandamento: paciência; 6º mandamento: justiça na fé; 7º mandamento: temor de Deus; 8º mandamento: fazer o bem e evitar o mal; 9º mandamento: firmeza na fé; 10º mandamento: alegria cristã; 11º mandamento: evitar os falsos profetas; 12º mandamento: ter o coração cheio de bondade e dirigido a Deus”.
Talvez não exista outro livro do cristianismo primitivo em que se desenhe, de uma forma tão viva, a vida da comunidade cristã. Basta, para ver isso, ler a visão terceira e a semelhança 9ª, para tomar conhecimento da marcha daquele povo de Deus que peregrina e no qual há dignos e indignos em todos os ramos.
No que diz relação à penitência, na obra é reconhecido que houve, sempre, fortes discussões relativas ao 4º mandamento (relativo à pureza). Poder-se-ia afirmar que existe uma penitência que garante a salvação após o batismo, sendo uma antiga instituição da Igreja. A penitência é universal, para todos aqueles que quiserem se arrepender. Falando em termos pastorais, a penitência deve ser feita imediatamente após ter sido cometido o pecado e assim produzirá a emenda, pois é muito difícil, ao reincidente, conseguir a vida eterna. A conversão do pecador, a sua reforma total (metánoia), esse é o fim intrínseco da penitência. Exatamente igual à santificação positiva que o batismo produz, é a santificação pela penitência. Portanto, a Igreja é uma instituição necessária para a salvação.
2 - Doutrina sobre Cristo.
Há passagens nos quais se identifica Cristo com o Espírito Santo. O autor nunca usa a palavra “lógos”, mas sim os termos “Salvador”, “Senhor” e “Filho de Deus”. Hermas considera o Salvador como Filho adotivo de Deus, enquanto à sua natureza humana.
3 - Eclesiologia.
A Igreja é a primeira de todas as criaturas e tudo foi criado por causa dela. Ela está fundada sobre a Rocha, o Filho de Deus e, neste mundo, tem de sofrer com o fato de que no seu seio haja bons e maus.
4 - O Batismo.
É chamado de selo. Ninguém pode entrar na Igreja sem ele.
5 – A Moral.
Como já foi indicado, O Pastor é mais um escrito moral. No que concerne ao adultério, a obra destaca que o marido pode despedir a sua mulher adúltera, mas lhe é vedado casar-se de novo. A mulher adúltera pode fazer penitência e se juntar novamente ao seu marido. A obra permite as segundas núpcias, embora faça uma grande apologia da viuvez dedicada a Deus.
V – OS APOLOGISTAS GREGOS DO SÉCULO II.
Na primeira metade do século II, a Igreja se dirige, pela primeira vez, ao mundo, entrando nos domínios da cultura e da ciência. O mundo está cheio de correntes contrapostas: escolas filosóficas que lutam entre si (estoicismo e platonismo). Há grande agitação religiosa. Já não é mais o tempo dos Padres Apostólicos, que guiaram e edificaram a espiritualidade dos fiéis. Trata-se, agora, de fazer um exame dos direitos da Igreja, de expor a doutrina cristã, de refutar as calúnias. Era necessário provar que a fé é uma força de primeira ordem para a preservação e o bem-estar do mundo. Era imprescindível mostrar que o paganismo constituía um absurdo e tinha caráter imoral. Que somente o Cristianismo possui uma ideia correta de Deus, com os seus dogmas da unidade da divindade, do monoteísmo, da divindade de Cristo e da ressurreição dos mortos.
Era, outrossim, urgente provar que a filosofia não tinha nunca atingido a verdade completa, mas apenas fragmentariamente, enquanto o Cristianismo, alicerçado na crença no Lógos de Deus, que é a sua mesma Razão, veio ao mundo em Cristo. Uma advertência muito importante é que a maior parte, quase a totalidade dos apologistas eram leigos, escreveram pela sua própria iniciativa e por sua conta e risco. Isto explicaria também determinadas impressões e até erros. A falta de esclarecimento da parte dos destinatários da pregação explicaria o fato de que, na pregação dos apologistas, passassem a segundo plano a pessoa do Salvador e a eficiência da graça.
Raramente os apologistas referem-se aos milagres de Cristo, sendo que se basearam, preferencialmente, em argumentos da Antiguidade. Como motivo de credibilidade (sendo isto uma anotação de grande atualidade), os apologistas atingem o ápice da sua grandeza quando se proclamam campeões da liberdade de consciência e fonte de toda religião verdadeira, como elemento indispensável para que a religião pudesse sobreviver.
1 – Quadrado de Atenas (98-129).
Escreveu uma Apologia e a entregou ao Imperador Publio Élio Adriano (117-138). O autor faz referência aos milagres de Cristo. Frisava no seu escrito: “As obras do nosso Salvador estiveram sempre presentes, posto que eram verdadeiras: os que ele curou, aqueles que ressuscitou dos mortos, não foram vistos somente no momento de serem curados e ressuscitados, mas estiveram sempre presentes, e isso não só enquanto o Salvador vivia aqui embaixo, mas ainda depois de sua morte sobreviveram por muito tempo, de sorte que alguns deles chegaram até os nossos dias”. Este texto foi transmitido por Eusébio de Cesareia (265-339).
2 – Aristides de Atenas (+134).
“Ao Imperador Adriano César, da parte do filósofo ateniense Aristides”. Assim começa a Apologia mais antiga que conhecemos e que foi entregue ao Imperador Adriano por volta de 125, pelo próprio Aristides, em Atenas. O autor narra como conheceu o Criador e Conservador do mundo, através da contemplação do universo. Os homens, para ele, se dividem em quatro classes: bárbaros, gregos, judeus e cristãos. Os bárbaros adoram os quatro elementos que não são mais do que obras de Deus. Os gregos adoram deuses que, pelas debilidades e infâmias que lhes são atribuídas, não são verdadeiramente deuses. Os judeus são credores de maior respeito, pois é mais puro o seu conceito sobre Deus, como também a sua moral. Mas, mais do que Deus, adoram os anjos e as suas práticas são exteriores e legais. Os cristãos conhecem Deus criador do Universo, em seu Filho unigênito e no Espírito Santo e não adoram nenhum outro deus. A sua vida é de uma pureza a toda prova, pelo qual demonstram que somente os cristãos possuem a ideia justa de Deus e são portadores da verdadeira doutrina. Não se pode negar a demasiada simplicidade da sua mensagem, se bem esta possa ser compensada pela nobre e elevada inspiração.
3 – Flávio Justino ou Justino mártir (100-165).
Nascido na Palestina, foi batizado no ano 130. Mártir, é uma das figuras mais nobres da literatura cristã primitiva, tendo-se convertido no mais importante apologista grego do século II. Ele próprio narra a sua vida na obra intitulada: Diálogos com o judeu Trifón. Das suas Duas Apologias e da sua morte dá notícia a obra intitulada: Actas martirii Sancti Justini et sociorum (Atas do martírio de São Justino e companheiros).
Justino nasceu em Flavia Neapolis (Naplusa ou Siquém), cidade da Samaria, na Palestina, entre 100 e 110. A sua família era pagã, talvez de origem latina. Foi educado no paganismo e, por inspiração secreta, terminou cultivando a filosofia como caminho para encontrar a plena verdade. Foi assim como se familiarizou com o estoicismo, os peripatéticos e o platonismo, tendência filosófica esta última na qual encontrou grande paz espiritual. Para Justino, a contemplação das ideias seduz a alma. Retirou-se para viver na solidão perto de Moab, em Cesareia da Palestina onde, de maneira especial, foi revelado a ele o Cristianismo. Foi assim como entrou em contato com os profetas e as pregações de Cristo, tendo-se convencido rapidamente “de que esta filosofia cristã era a única segura e aproveitável”.
Foi então quando, segundo o seu próprio testemunho, começou a ser verdadeiro filósofo. Daí em diante, “como apóstolo zeloso da nova filosofia, consagrará a sua vida de leigo a defender e ensinar o Cristianismo. Vestiu o “pallium” ou manto dos filósofos gregos e dedicou-se às viagens como pregador ambulante.
Justino morou em Roma durante o reinado do Imperador Antonino Pio (138-161) e ali fundou uma escola privada de filosofia, tendo sido o apologista Taciano (120-172) um dos seus discípulos. Em 152, Justino entregou a Antonino Pio um requerimento em favor dos cristãos. Ainda em Roma e no início do reinado do Imperador e filósofo Marco Aurélio (161-180), Justino escreveu outra Apologia, aproveitando o fato de o novo imperador ser filósofo. Morreu decapitado, junto com seis companheiros, por volta de 165. As virtudes de Justino foram a autenticidade das suas convicções cristãs, a nobreza de caráter e a perfeita lealdade aos seus companheiros de Igreja e o projetaram como um dos mais importantes apologistas. O eminente teólogo do Instituto Angelicum de Roma, Reginald Garrigou Lagrange (1877-1964) colocou Justino como o patrono das almas retas, sinceras e corajosas.
Quanto à sua obra, pode-se afirmar que Justino não foi um grande escritor nem um pensador original e profundo. O seu valor radica no fato de dar conta das correntes mais em voga na Roma imperial da época. A sua erudição é falha. No entanto, o seu testemunho acerca da vida dos cristãos na Roma imperial de então é autêntico e vivo. Somente chegaram aos nossos dias três das suas obras: as duas Apologias contra os pagãos e o seu Diálogo com o judeu Trifón.
Os seus escritos exerceram uma atração muito forte, em decorrência do caráter de diálogo amistoso com os pagãos que os caracterizou. Buscava sempre chegar a um acordo com os seus parceiros de diálogo. Acreditava que “todo aquele que podendo dizer a verdade não a diz, será julgado por Deus”. Justino é o primeiro escritor cristão que tende a mão à filosofia pagã, a fim de encontrar um caminho de encontro com ela.
A Primeira Apologia de Justino consta de 68 capítulos e é dirigida ao Imperador Antonino Pio. Consta de uma Introdução (capítulos 1 a 3), que é uma exortação ao Imperador para que ele examine o caso cristão e veja se o Cristianismo é digno ou não de condenação. Os capítulos 4-12, que constituem a Primeira Seção, se centram sobre a reclamação de que as condenações de que os cristãos são vítimas não têm cabimento, por estarem alicerçadas mais em denúncias caluniosas. As ideias escatológicas (acerca da Justiça implacável de Deus nos últimos tempos e do temor em face do castigo eterno) fazem dos cristãos, argumenta Justino, homens muito íntegros e, em decorrência disso, cidadãos nos quais o governo pode confiar.
A Segunda Seção da obra (capítulos 13-67) constitui uma justificação do Cristianismo. O autor trata da doutrina cristã, do culto e dos seus fundamentos históricos. 1 - quanto à doutrina, Justino destaca que os cristãos professam ser Jesus Cristo o Filho de Deus e o fundador da Religião Cristã. Esta é pregada para converter e restaurar a humanidade em Deus. 2 – Quanto ao culto, Justino descreve o batismo, a liturgia da eucaristia e a vida social dos cristãos. A obra termina com uma conclusão em forma de séria admoestação ao Imperador Antonino Pio. Inclui cópia da determinação do Imperador Adriano ao Procônsul da Asia, Minúcio Fundano (datada de 125). Ora, esse documento era importante porquanto determinava que: a – Os Cristãos fossem julgados mediante um procedimento regular perante um tribunal criminal. b – Eles somente pudessem ser condenados se houvesse provas de atos praticados por eles contra o Império. c – Os castigos deveriam ser proporcionais aos crimes cometidos. d – Seria imposto um castigo severo a quem acusasse falsamente um cristão.
A Segunda Apologia de Justino talvez fosse uma adição à primeira, segundo consenso dos estudiosos. Foi escrita em Roma. A circunstância que motivou este escrito foi a condenação à morte, por decapitação, de três cristãos. Qual teria sido a sua culpa? - indaga o autor. E responde: “Pois ter confessado a sua fé”. Indignado, Justino apelou diretamente à opinião pública de Roma, com as seguintes palavras: “Não temos consciência alguma de que eles cometeram qualquer crime. Consideramos, portanto, que a morte deles é uma completa injustiça. As perseguições contra os cristãos devem-se aos demônios. Mas eles não teriam poder algum sobre os cristãos se Deus não quisesse conduzir os seus seguidores através das tribulações e sofrimentos, para que atingissem a virtude e o prêmio”.
No Diálogo com o judeu Trifón, o cenário é a cidade de Éfeso. Justino sintetiza o diálogo que efetivamente manteve com o rabino judeu Tarfón e que durou dois dias. Esta obra é a mais antiga das apologias contra os judeus e se divide em 142 capítulos. Na Introdução (capítulos 2-8), Justino conta como foi a sua formação intelectual e de que maneira ocorreu a sua conversão ao Cristianismo. Na Primeira Parte da obra, (capítulos 9-47), o autor narra de que forma os cristãos encaravam o Antigo Testamento, abordando-o como uma pedagogia em direção a Cristo. A Segunda Parte (capítulos 48-108), trata da fundamentação bíblica da adoração a Cristo como Deus. A Terceira Parte (capítulos 109-142) constitui uma prova de como o Novo Israel está integrado pelos povos que acreditam em Cristo e seguem a sua voz.
Justino se apresenta antes de tudo como filósofo. Gosta desse título. O sentido da Filosofia para ele era sinônimo de Cristianismo. Utiliza os dados da filosofia profana nas suas exposições religiosas, especialmente a doutrina do Lógos. Heráclito de Éfeso (século III aC) foi, segundo Justino, o primeiro que chamou de Lógos um certo princípio permanente de ordem e estabilidade no mundo material ou no contexto racional. Mas esse princípio, em Heráclito, é ainda algo de material e se confunde com o fogo. No Estoicismo e no Neoplatonismo a doutrina do Lógos joga um papel preponderante. Identifica-se, então, com o denominado “mundo inteligível” platônico, que é modelo e princípio do mundo sensível graças ao “Lógos”. Os Estóicos, que eram panteístas, não admitiam nenhum princípio transcendente ao mundo. Este se bastava a si mesmo e possuía em si a sua força e a sua lei. Esta “alma do mundo” é precisamente o “Lógos” que é denominado, amiúde, de “Logos spermatikós” (ou Lógos seminal) enquanto constitui o germe de onde sai o mundo e a força vital que o anima. O Lógos estoico é completamente um deus equivalente a Zeus, pai dos deuses. Popularizado pelos estóicos, o Lógos veio a se impor também aos discípulos de Platão como “razão”. O “Lógos” veio a ser o centro das ideias divinas, a causa ideal do mundo. Enquanto “palavra”, o “Lógos é o instrumento de que Deus se serve para criar e governar. O “Lógos” existe enquanto força de Deus nos seres particulares, em especial o homem, e, sobretudo, naqueles em que Deus depositou “lógoi” parciais, germes divinos, princípios de ordem.
Os judeus helenistas aceitaram a doutrina do “Lógos” e a adaptaram ao seu monoteísmo. Isto foi especialmente obra de Fílon de Alexandria. Inclinado a fazer de Deus uma ideia tão alta que a sedimentava quase numa abstração, tinha, portanto, no “Lógos” um intermediário útil que dispensava Deus do contato com o mundo e com as almas ainda não suficientemente puras para a contemplação do soberano bem. Encarregado a falar com os homens de parte de Deus, o “Lógos”, o primeiro nascido de Deus, era, pois, Deus também, e Fílon o diz abertamente, embora não saiba definir completamente a sua personalidade.
Quanto à concepção do “Lógos”, Justino é o primeiro em estender a mão às almas imbuídas da filosofia grega e da doutrina do “Lógos”. Essa preocupação, que não parece em nenhuma parte nos escritos de São João Evangelista, é evidente em Justino, aparecendo especialmente na sua Segunda Apologia. Mais ainda: parece que Justino, utilizando o termo “Lógos”, fá-lo menos por razões culturais ou dogmáticas do que para mostrar que o cristianismo, além do judaísmo, teria sido preparado também para o paganismo. Ou seja, para o Estoicismo e o Neoplatonismo.
Justino distingue, na sua Segunda Apologia, a expressão “ho pãs lógos”, relativa ao Verbo de Deus absolutamente distinto do Universo, da expressão “ho spermatikós lógos” que se refere ao “Lógos” presente nos homens, sobretudo nos prudentes, não por emanação, como de fato era para os Estoicos, mas por uma semente recebida e, por isso mesmo, distinta: a razão humana. Graças a uma atividade sábia e prudente, a razão pode se elevar até um conhecimento parcial, imperfeito, mas muito alto do Verbo perfeito, do “Lógos” divino. Justino confirma pois, assim, a sua confiança na razão, justificando essa atitude pelo laço que une o espírito humano e o “Lógos” divino. Mas, de outro lado, ele evita se contentar com esse laço racional. “O conhecimento pleno – diz Justino -, o conhecimento completo e seguro do ‘Lógos’ divino, somente nos é dado por Revelação. O ‘Lógos’ é Cristo”.
Os filósofos gregos, pensava o apologista, tiveram um conhecimento parcial do “Lógos” e esse conhecimento os levava a serem perseguidos. Para Justino, os cristãos têm o conhecimento perfeito do Verbo graças à Revelação e, por isso, as perseguições contra eles são as mais duras. A exposição de Justino traz importantes consequências. Trata-se de um chamado ao testemunho da razão acerca das verdades essenciais que ensina o Cristianismo: a existência de Deus, a imortalidade da alma, a distinção entre o bem e o mal, a expectativa do juízo acerca do bem e do mal, da expectativa do prêmio ou do castigo eternos após a morte. A obra de Justino inspirou a Orígenes de Alexandria (185-254), Santo Agostinho de Hipona (354-430) e São Tomás de Aquino (1225-1274).
Teologia de Justino.
As obras puramente teológicas de Justino infelizmente se perderam. O seu pensamento teológico acusa a influência platônica, sendo esta a doutrina de maior valor filosófico para ele. Deus é “sem princípio” (árretos). Por isso mesmo, não tem nome. É inexprimível, inefável. Como é o criador de tudo, podemos lhe dar o nome de Pai (patér pántõn). Deus Pai vive nas regiões de cima do céu e não é substancialmente onipresente. É necessário, para encontrá-lo, transpassar o abismo imenso que há entre Deus e o mundo. Esse é o trabalho do Lógos que, como tal, se constitui em mediador de Deus Pai e o mundo, o qual foi criado pelo Lógos, pois este, em princípio, morava em Deus como uma potência. Mas, pouco antes da criação do mundo, emanou e procedeu d’Ele. Justino inclina-se em prol do insubordinacionismo, quando explica as relações entre Deus Pai e o Lógos. A geração do Lógos é, para ele, “ab aeterno”. O Verbo veio a ser pessoa divina, mas subordinada ao Pai.
Maria e Eva.
Da mesma forma que São Paulo assinalava o paralelismo entre Cristo e Adão, Justino o estabelecia entre Maria e Eva, ponto no qual é original. Quanto aos anjos e demônios, afirma Justino: “Ao exército dos anjos bons damos culto”. Justino testemunha o culto aos anjos, os quais, desde o Céu, cuidam dos homens e têm, apesar de sua natureza, um corpo similar ao humano. O pecado original, que constituiu uma espécie de deificação (“sereis como deuses”, teria dito a astuta serpente a Adão e Eva). “Mas agora, frisava Justino, o homem voltou a recobrar o poder de se fazer Deus, pois “aos homens foi-lhes concedido o poder de chegar a ser deuses e podem se converter em filhos do Altíssimo. Culpa deles é se, como Adão e Eva, são julgados e condenados”.
Batismo e eucaristia.
No final da sua Segunda Apologia, sobressai a descrição da liturgia destes dois sacramentos. No capítulo 65, fala-se da liturgia eucarística dos recém batizados. No capítulo 67, Justino trata da liturgia eucarística dominical. Aparece aquí o papel do Presidente da assembleia eucarística, bem como o dos diáconos e dos fiéis na celebração da eucaristia. Não somente são repetidas as mesmas palavras da instituição da eucaristia por Cristo, mas é lembrado todo o relato da instituição, que formava parte fixa da oração consagradora. Para entender a doutrina de Justino sobre o sacrifício eucarístico, é necessário levar em consideração a doutrina acerca do Lógos. Justino rejeitava o sacrifício material das coisas criadas e expõe o seu conceito de sacrifício que salvaguardava a distância entre a filosofia pagã e o Cristianismo, ou seja, a “logiké ousía” que traduz como “oblatio rationalis” ou sacrifício espiritual, a única forma de adoração digna de Deus segundo os filósofos gregos complementados pelos Profetas. “A eucaristia – frisava Justino - é o sacrifício espiritual por tanto tempo desejado: a logiké ousía, pois o mesmo Lógos, Jesus-Cristo é aqui a vítima”. O termo “oblatio rationalis” do Cânone da Missa Romana, é isso que quer expressar Justino.
Quanto à Escatologia, Justino é milenarista. Considera que as almas dos justos vão primeiro ao Hades, com exceção dos Mártires (que partem direito para o Céu), e ali permanecem até o fim do mundo. Mas, mesmo no Hades, as almas boas estão separadas das que pertencem aos maus. Justino considera, no entanto, que há outros que não pensam como ele.
4 – Taciano o Assírio (120-180).
Pela sua veemência, foi chamado de “o Tertuliano do Oriente”. Natural da Síria, era um erudito, educado segundo a pedagogia grega. Era Sofista, ou “orador ambulante”. Estudou várias religiões, mas terminou abraçando o Cristianismo em Roma, onde fez os cursos oferecidos por Justino. Após a morte deste, abriu uma escola. Por volta de 172 aderiu à heresia “encratista”, que condenava o casamento como uma fornicação e admitia a existência de “eones”, seres divinos intermediários entre Deus e os homens. Nesse ano escreveu o livro intitulado: Diatessaron, que consistia numa sinopse dos Evangelhos.
Diferentemente de Justino, que valorizava a filosofia grega, Taciano a rejeitava completamente. Manifestava o seu ódio encarniçado à civilização grega (notadamente à arte e à ciência). As suas apreciações sobre cultura em geral primavam pela falta de equilíbrio. Duas obras sobressaem da sua produção: Diatessaron e Discurso contra os gregos.
O Diatessaron constitui uma versão única dos quatro Evangelhos formada a partir da adição de textos canónicos e foi usada na Síria até o século V. Ao que parece, a obra foi originalmente composta em grego e depois traduzida pelo próprio Taciano para o siríaco.
O Discurso contra os gregos constava de uma introdução (capítulos 1-4), uma primeira parte na qual o autor pretendia mostrar a superioridade dos cristãos sobre os pagãos no que tange à doutrina sobre o Lógos, a ressurreição, os anjos, a alma, o espírito e o mundo (capítulos 5 a 30). Seguia uma segunda parte (capítulos 31 a 42), na qual o autor dissertava sobre a cronologia relativa aos escritos bíblicos, mostrando que estes eram anteriores às obras pagãs.
5 – Atenágoras de Atenas (133-190).
“Eu sou ateniense, filósofo cristão” diz Atenágoras no início da Apologia que apresentou ao imperador Marco Aurélio. Essa obra é uma das mais belas Apologias da Antiguidade. Sabe-se pouco acerca da vida de Atenágoras. Foi contemporâneo de Taciano, mais moderado e mais hábil do que Justino na linguagem, no estilo e na ordenação do discurso. É, sem dúvida, o mais eloquente dos Apologistas antigos. O seu Tratado sobre a ressurreição dos mortos (Perì anastáseos necrõn) é de caráter filosófico e prova a ressurreição à luz da razão. Duas teses são desenvolvidas: em primeiro lugar, a ressurreição é possível porque não contradiz nem a ciência de Deus, nem o seu poder, nem a sua justiça. Em segundo lugar, esta ressurreição terá lugar realmente, pois é necessária em virtude: a – do destino do homem, que foi criado para viver sempre; b – da natureza humana (formada de alma e corpo); c – do juízo que deverá ser aplicado tanto à alma quanto ao corpo; d – do fim último, inatingível nesta vida.
A obra intitulada: Apologia ou Súplica em favor dos cristãos (Presbéia perì tõn Xristianõn) é o principal escrito de Atenágoras. Nela, são refutadas (como em Justino e Taciano) as acusações contra os cristãos: de ateísmo (capítulos 4 a 30), de imoralidade (capítulos 31-34) e de antropofagia (capítulos 35-36). Tudo isso é precedido de um exórdio, no qual o livro é dedicado aos Imperadores. Os capítulos 37 e 38 são uma conclusão em forma de chamada urgente dirigida aos destinatários, os Imperadores Marco Aurélio (121-180) e Cómodo (161-192). A obra foi escrita por volta de 177.
Teologia de Atenágoras.
Atenágoras é o primeiro a tentar uma demonstração científica do monoteísmo. É muito mais explícito que Justino, quando define que o Lógos é Deus e que é uno essencialmente com o Pai, evitando o subordinacionismo. O Filho, para ele, não é “feito”, simplesmente porque provém do Pai. Define a Trindade da seguinte forma: “Um Deus Pai, um Deus Filho e um Espírito Santo, que mostram a sua potência e a sua diferenciação na ordem das relações com a criação”. Atenágoras falava da existência de uma multidão de anjos e ministros criados por Deus. Quanto à inspiração do autores sagrados, Atenágoras escreve: “Temos por testemunhas os Profetas os quais, movidos pelo Espírito Divino, falaram acerca de Deus e das coisas de Deus, O Espírito de Deus moveu, como instrumentos, as bocas dos Profetas.
Atenágoras louvava a virgindade “como um dos mais belos frutos da moral cristã”. Acerca do aborto, diz: “Afirmamos que os que intentam o aborto cometem um homicídio e dele terão de prestar contas a Deus”. Segundo o Direito Romano da época, o feto não era sujeito de direito à existência, pois não constituía um ser absoluto. Atenágoras negava a veracidade dessa afirmação, sustentando o contrário: “o feto é sujeito de direito à existência”.
VI – OS APOLOGISTAS GREGOS E LATINOS DO SÉCULO III.
Neste item serão desenvolvidos os seguintes itens: 1- O pensamento de Tertuliano (160-220). 2- Santo Irineu de Lião (130-202). 3 - Uma caracterização geral da Escola de Alexandria. 4 - O pensamento de São Clemente de Alexandria (150-215)
1 – Tertuliano (160-220).
Quinto Septimio Florêncio Tertuliano nasceu, de pais pagãos, em Cartago. O seu pai, um centurião da coorte proconsular, deu-lhe esmerada educação. Graças à sua formação jurídica sólida adquiriu grande fama de advogado em Roma. Convertido ao Cristianismo por volta de 193, colocou todo o seu saber nos terrenos do direito, da literatura e da filosofia em função da sua reflexão sobre a nova religião por ele abraçada. É pouco provável, no entanto, que tenha sido sacerdote. O seu rigor ortodoxo conduziu-o à seita montanista, onde tornou-se líder de uma das correntes dessa doutrina, que passou a ser chamada de “tertulianismo”. Faleceu em Cartago.
Tertuliano é o mais importante e o mais original dos autores cristãos latinos, depois de Santo Agostinho de Hipona (354-430). Com rara erudição luta ardentemente pela verdade, sem ceder perante os inimigos pagãos, judeus, hereges e, ulteriormente, católicos. Todos os seus escritos são polêmicos. Parece que o fator definitivo na sua conversão foi o heroísmo dos cristãos nas perseguições. Era fanático pela busca e a defesa da verdade. Queria chegar ao martírio por ela. É um defensor incondicional do espírito religioso. “Todo homem – frisava - tem o direito a escolher a sua própria religião”. Podemos frisar, com Quasten, que “sempre trata de provar demais. Quando fala ou atua, fá-lo como advogado, preocupado unicamente em ganhar a sua causa e em aniquilar o adversário. Por isso, em mais de uma ocasião, pode ser que deixe calados os seus adversários, sem convencê-los”.
Tertuliano possui um grande mérito literário. Ninguém, desde Tácito, tinha dado vida a tantas palavras ou frases belas, incisivas e duradouras. Ama a concisão, o que, às vezes, torna o seu estilo de difícil compreensão. Gosta de antíteses e jogos de palavras e prefere as frases curtas. Ocupa lugar elevado na história do Latim cristão, pela grande quantidade de termos novos, que encontraram uso permanente no vocabulário dogmático.
1.1 - Obra de Tertuliano.
Divide-se em três tipos: A - Escritos Apologéticos. B - Tratados Polêmicos. C - Obras sobre disciplina moral e ascese.
A - Escritos Apologéticos.
Podemos mencionar, aqui, as obras intituladas: Ad Nationes, o Apologeticum e De testimonio animae. Os dois primeiros escritos relacionam-se entre si. Foram publicados em 197.
A tese de Ad Nationes é a seguinte: os pagãos condenam aquilo que não conhecem e decidem pela condenação dos Cristãos, no contexto de um processo jurídico injusto e irracional. Nos capítulos 7 a 19 da obra, Tertuliano ataca as calunias levantadas. Os pagãos - frisa - não têm autoridade moral para condenar ninguém, pois praticam atos muito mais censuráveis que os contidos nas suas calúnias contra os Cristãos. O autor faz, a seguir, uma violenta condenação do paganismo.
O Apologeticum é a principal obra de Tertuliano. O autor mostra-se, aqui, mais circunspecto do que na obra anterior. O escrito não é dirigido aos pagãos em geral, mas especificamente aos governadores das províncias romanas, seguindo um plano pré-ordenado. O autor considera que a justiça contradiz todo o processo judicial contra os Cristãos, somente sendo a ignorância o fator que explica o ódio professado contra eles. Se existe uma alta regra de moralidade e um fim excelente no Cristianismo, as suas leis são boas e não podem contradizer o Estado. Jamais tem sido possível provar os crimes de que são acusados os Cristãos, enquanto os pagãos são culpáveis desses atos. Cada pessoa tem liberdade de religião e não é certo que seja a adoração aos ídolos pagãos o fator que torna possível, aos Romanos, dominar o mundo, pois Deus dá o poder àquele que Ele quiser. O autor elabora uma bela descrição do culto cristão e rejeita a ideia de que o Cristianismo não é mais do que uma nova filosofia. O Cristianismo é, muito pelo contrário, revelação de Deus e por esse motivo é indestrutível. "Tornamo-nos mais numerosos cada dia que nos cortais - frisa Tertuliano -. O sangue dos Cristãos é semente". Os estudiosos concordam com a opinião segundo a qual o Apologeticum é a obra mais bela do autor latino.
O tratado De testimonio animae defende a tese de que Deus pode ser conhecido a partir da observação do imenso e pequeno Universo. Assim fizeram Séneca e Fílon, por exemplo. E assim procede Tertuliano. Este ensaio foi escrito em 197. Segundo o autor, há verdades que estão presentes na alma e que para descobri-las não é necessário ser filósofo. Estão presentes na alma, por exemplo a existência e os atributos de Deus, a vida depois da morte, o prêmio e o castigo. A natureza é mestra da alma, pois através dela o homem descobre a imagem de Deus.
B - Tratados Polêmicos.
Várias obras se incluem nesta parte, como De praescriptione haereticorum (Acerca da prescrição dos heréticos), Adversus Marcionem (Contra Marcião), De Baptismo (Acerca do Batismo), De carne Christi (Acerca da carne de Cristo), Adversus Praxeam (Contra Praxeas), De anima (Acerca da alma) e De ressurrectione carnis (Acerca da ressurreição da carne). O tratado De praescriptione haereticorum tira o seu nome de uma objeção jurídica que permitia ao defensor deter a marcha do processo. Tal objeção era apresentada por escrito, com anterioridade à "intentio" na formulação do processo ("praescriptio"). Aqui temos duas "praescriptiones": A primeira seria a seguinte: Cristo enviou os seus Apóstolos como pregadores do Evangelho. Em decorrência disso, ninguém mais será recebido como tal. A segunda "prescrição" seria a seguinte: os Apóstolos fundam as Igrejas de acordo ao que Cristo lhes revelou, pois "como vou prescrever agora, não se poderá provar senão a partir do testemunho dessas Igrejas". Caso contrário "será falsa essa doutrina". Do ângulo jurídico, este escrito é a obra mestra de Tertuliano. Foi publicado no ano 200, quando o autor ainda era "católico".
Adversus Marcionem era uma obra mais extensa e representa a principal fonte para conhecer a heresia de Marcião. De Baptismo é o único tratado escrito sobre o batismo e a confirmação antes do Concilio de Nicéia e é de grande importância para a História da Liturgia. Acerca do batismo, frisava Tertuliano: "Não há mais do que uma exceção à necessidade de receber o batismo de água; esta exceção é o martírio, segundo batismo, batismo de sangue". O ministro ordinário do batismo é o bispo. Os presbíteros, diáconos e leigos podem administrá-lo, mas só com autorização do bispo. Podem administrá-lo os leigos, "pois se o recebem todos no mesmo grau, podem todos ministrá-lo da mesma forma". Deve examinar-se, antes, a fé do batizando. Tertuliano não olhava com bons olhos, por esta razão, o batismo das crianças. Imediatamente após o Batismo, segue a Confirmação, que confere o Espírito Santo pela imposição das mãos.
De carne Christi. Este escrito está intimamente unido com o intitulado: De ressurrectione carnis. Os dois tratados são uma prova, sustentada por Tertuliano, de que a carne haverá de ressuscitar. É refutado o "Docetismo" de Marcion e a doutrina de Apeles, que ensinava que Cristo teria tomado a sua natureza das estrelas. É refutada, também a doutrina de Valentin, para quem a natureza de Cristo era constituída por uma substância espiritual. A respeito, frisa Tertuliano: "Cristo se fez em tudo como nós, com exceção do pecado; mas não nasceu de sêmen humano, não tendo conhecido, assim, nem a carne do primeiro, nem do segundo Adão, o pai terreno". Em outro lugar, frisa o nosso autor: "O corpo do homem foi criado por Deus, redimido por Cristo e deve, portanto, ser julgado junto com a alma no final do mundo. A ressurreição do corpo é testemunhada pelo Antigo e pelo Novo Testamentos".
Adversus Praxeam. Praxeas professava as doutrinas "modalista" e "patripaciana", segundo as quais "o Pai era o mesmo Filho". O Pai teria descendido da Virgem, nasceu dela e sofreu. Ele foi Jesus Cristo. Quando tal doutrina chegou em Cartago, Tertuliano escreveu o livro em apreço, se constituindo no mais importante escrito do nosso autor acerca da Santíssima Trindade, antes do Concílio de Nicéia (325). De fato, esse Concílio utilizou muitas de suas fórmulas. Tertuliano é o primeiro escritor latino que utiliza o termo "Trinitas" tecnicamente. A propósito, o autor frisa: "São três, mas não pela qualidade, mas pela ordem. Não pela substância, mas pela forma. Não pelo poder, mas pelo aspecto, pois as três (pessoas) têm uma só substância, uma só natureza, um só poder. Porque não há mais do que um só Deus". "Mas, em razão do seu rango, da sua forma e do seu aspecto, essas (pessoas) são designadas com os nomes de Pai, Filho e Espírito Santo". No entanto, quando procede a tratar da divisão das Três Pessoas, não consegue evitar o subordinacionismo.
De Anima. Para Tertuliano, há um sêmen do corpo e um sêmen da alma. O ato de geração produz o homem inteiro: corpo e alma. Há um sêmen que produz a alma e flui diretamente da alma dos pais. Dessa teoria depreende-se a heresia do "traducianismo", que nega a criação direta e imediata da alma individual por Deus. Tertuliano refuta a transmigração das almas ensinada por Pitágoras (570-495 AC), Platão (428-348 AC) e Empédocles de Agrigento (494-430 AC). Segundo Tertuliano, todos os espíritos permanecem no Hades até a ressurreição, com exceção dos mártires, que vão diretamente para o Céu. A obra foi escrita entre 210 e 213, quando o autor era já montanista.
C - Obras sobre a disciplina moral e a ascese.
Nestes escritos aparecem, com maior claridade, as crenças montanistas de Tertuliano. Destaca-se, aqui, o seu tratado De Oratione (Sobre a Oração), obra preciosa não pela profundidade das ideias, mas pela viva expressão que confere à concepção autêntica da vida cristã. O tratado De Poenitentia (Acerca da Penitência) é de extraordinária importância para a história do Sacramento da Penitência. Anotemos que Tertuliano era ainda católico quando o escreveu, em 203. A primeira parte da obra trata do adulto que quer o batismo. A segunda parte refere-se à segunda penitência, que garante a existência de um perdão depois do Batismo, em virtude do qual "não deve se desesperar aquele que caiou". Para obter a "segunda penitência", o pecador deve se submeter à exomológesis ou confissão pública e mortificação necessária, tudo o qual levava a uma absolvição oficial da parte da Igreja.
No tratado Ad Uxorem (Sobre a Esposa), escrito por volta de 206, Tertuliano dá conselhos à esposa para depois da sua morte. O mais brilhante dos três escritos sobre o matrimônio, mas também o mais agressivo, é o De Monogamia (Sobre a Monogamia), escrito quando já era montanista. Tertuliano escreve nele: "Nós, pelo contrário, que com justiça nos chamamos de 'espirituais', não admitimos mais do que um único casamento, do mesmo modo que não reconhecemos mais que um só Deus". Considera ilícitas as segundas núpcias, sendo estas muito próximas do adultério. Este tratado foi escrito em 217.
O tratado De Idolatria (Acerca da Idolatria) é um escrito de inspiração montanista. Propõe-se libertar o cristão de tudo quanto estiver de algum modo relacionado com a idolatria. Condena o serviço militar (pois o Imperador era tido como divindade), bem como os astrólogos, as matemáticas, os mestres de escola, os professores de literatura, os gladiadores, os vendedores de incenso, os feiticeiros e os magos. Como se colocasse a pergunta: "E então, como viveremos?" , o autor respondia que a fé não tem medo da fome. Condena a seguir a pintura, as esculturas, as artes plásticas e proíbe toda participação em festivais públicos. E conclui: "Todos os poderes e dignidades deste mundo não só são estranhos a Deus, como são também os seus inimigos".
1.2 - Ideias teológicas de Tertuliano.
Tertuliano estava convencido de que a filosofia e a fé não têm nada em comum. Para ele, toda ciência humana deve ser expulsa da Igreja. A sua principal contribuição situa-se na teologia da Trindade, bem como na Cristologia. Muitas das suas fórmulas são maravilhosas e perenes. No seu tratado intitulado: Adversus Praxeam encontramos a melhor exposição da sua doutrina trinitária. Escreve a propósito: "Tres unius substantiae et unius statûs et unius potestatis. Filium non aliunde deduco sed de substantiâ Patris; Spiritum non aliunde deduco quam a Patre per Filium" (Três de uma substância e de um status e de uma potestade. Não deduzo o Filho de uma origem diferente da substância do Pai; não deduzo o Espírito de uma origem diferente do pai pelo Filho"). Tertuliano é o primeiro a utilizar o termo "Pessoa", tão famoso na história da teologia posterior. No entanto, às vezes tem um sabor subordinacionista.
Na sua Cristologia há fórmulas idênticas às do Concilio de Niceia. Afirma, de Cristo, as duas naturezas na única pessoa. Não há transformação da divindade em humanidade, nem tampouco uma fusão ou combinação. Quanto à Maria, ela dá realmente a sua substância a Jesús, mas afirma isso tão enfaticamente que chega a negar a virgindade de Maria no parto e depois do parto. A Igreja é "domina mater Ecclesia", sendo, assim, o primeiro em chamar Mãe" a Igreja. A propósito, afirma: "Vós, pois, benditos, a quem espera a graça de Deus, que vais sair do banho santíssimo do nascimento novo e vais estender, por vez primeira, vossas mãos para orar no seio de uma Mãe juntamente com vossos irmãos, pedi ao Pai, pedi ao Senhor, como presente especial de sua graça, a abundância dos seus carismas". A criação de Eva do costado de Adão prefigura o nascimento da Igreja. "Como Adão foi a figura de Cristo, assim o sonho de Adão prefigurou a morte de Cristo, que devia dormir o sonho da morte, a fim de que a Igreja, verdadeira Mãe dos viventes, fosse figurada pela ferida aberta no seu costado" (Tratado De Anima, anos 210-212). A Igreja é o receptáculo da fé e a guardiã da Revelação. Somente ela herda a verdade e os escritos que a conservam. Só ela possui as Escrituras. Só ela tem a doutrina dos Apóstolos e a sua legítima sucessão. Só ela, pois, pode ensinar o conteúdo de sua mensagem.
A Penitência. Todo pecador, mesmo o maior, pode ser admitido à segunda remissão; no entanto, o Tertuliano montanista já no aceita tal possibilidade, restringindo-a unicamente aos pecados leves. O pecado de fornicação, sobretudo, é irremissível, como também a idolatria e o homicídio. E se alguém argumentasse que Cristo perdoou esses pecados, Tertuliano responderia que o Salvador fazia isso em virtude de um poder exclusivamente pessoal, que não transmitiu diretamente à Igreja. E se se alegasse, com Mateus 16, 18, Tertuliano nega simplesmente à Igreja o poder de atar e desatar, pois diz ele, "esse poder foi dado a Pedro a título pessoal e não aos outros bispos". O poder de perdoar os pecados não pertence à hierarquia, mas ao "homo spiritualis" (repetindo a tese dos montanistas).
Quanto à escatologia, Tertuliano fala de um sofrimento de purgação depois da morte, se bem não pronuncia a palavra "purgatório". Os mártires não passarão por tais tormentos. Os demais devem permanecer "apud ínferos" (nos infernos) até o Juízo Final, depois do qual os santos estarão para sempre com Deus, mas os ímpios penarão com fogo eterno para sempre. Tertuliano comparte, por último, a opinião dos milenaristas, de que ao fim deste mundo os justos ressuscitarão para reinar durante 1.000 anos com Cristo em Jerusalém, quando Ele descer do céu.
2 – Santo Irineu de Lião (130-202).
Nasceu na Ásia Menor (atual Turquia), na parte oriental do Império Romano, provavelmente em Esmirna, onde escutou a pregação da doutrina cristã pregada pelo bispo Policarpo, tendo sido este, por sua vez, discípulo do Apóstolo São João. Irineu foi o maior teólogo do seu século. Por razões desconhecidas abandonou a Ásia e se estabeleceu na Gália. Era presbítero da Igreja de Lião quando, a pedido dos mártires dessa cidade, visitou o Papa Eleutério, com a finalidade de buscar uma orientação em relação à doutrina do montanismo. Tendo regressado de Roma, com a morte do bispo de Lião, Fotino, foi sagrado como o seu sucessor. Na questão acerca do significado da Páscoa levantada pelo papa Víctor, Irineu exerceu o papel de “pacificador” (eirenopoiós). Não se sabe nada acerca da forma em que morreu, no ano de 202.
Na sua doutrina, Irineu trata acerca de uma preocupação: como defender a verdade católica contra os hereges gnósticos e como destruir essa heresia. A sua obra principal intitula-se: Contra os hereges: Descoberta e derrubada da falsa gnose. Esta obra, junto com o seu livro intitulado: Demonstração do ensinamento apostólico constituem os dois únicos escritos que se conservam de Irineu.
A primeira obra, Contra os hereges, divide-se em duas partes: na primeira, Irineu tenta identificar a heresia gnóstica. A ela pertencem os Valentinianos, Simão Mago, Menandro, Satornil, Basílides, Carpócrates, Cerinto, os Cebionitas, os Nicolaitas, Cerdão, Marcião, Taciano e os Encratitas. Na segunda parte da obra, Irineu desenvolve quatro livros, nos quais refuta as principais heresias como a dos Valentinianos, a partir de argumentos alicerçados na doutrina eclesiástica acerca de Deus e de Jesus Cristo, bem como sobre o sentido da ressurreição da carne, negada pelos gnósticos. Irineu faz uma descrição clara, simples e persuasiva acerca da doutrina da Igreja.
A segunda obra de Irineu, Demonstração do ensinamento apostólico, constitui um tratado apologético dividido em duas partes: na primeira, estuda o conteúdo essencial da fé cristã, na trilha da história das revelações de Deus ao homem, desde Adão até Jesus Cristo. Na segunda parte, Irineu apresenta provas em prol da Revelação Cristã, a partir das profecias do Antigo Testamento. A Apologia foge do tom polêmico, pretendendo ser, apenas, uma prova positiva da doutrina verdadeira.
A Teologia de Irineu tinha uma tendência a suspeitar de toda ciência especulativa. Irineu, contudo, merece o título de fundador da teologia cristã, ao desmascarar o falso cristianismo dos gnósticos e defender a fé como um grande triunfo. O universo da fé não é criação humana. É graça de Deus. Ao tratar da Trindade, Irineu ataca os gnósticos que pretendiam ser esta uma criação puramente especulativa da razão humana. Detém-se num fato: a identificação do Deus único como verdadeiro criador do mundo, identificando-o com o Deus revelado no Antigo Testamento. Deus é o Pai do Lógos. A história da humanidade prova que existem o Pai, o Filho e o Espírito Santo. O Lógos, Filho de Deus, inspira os profetas. Todo o Plano Salvífico, no Antigo Testamento, é um ensinamento sobre as Três Pessoas da Trindade, que são um só Deus.
Ninguém entende a geração do Filho pelo Pai; somente o Pai a entende. Deus manifestou-se pelo Filho que está no Pai e tem em si o Pai. Há um só Cristo idêntico ao Filho de Deus. Toda a Teologia e a Cristologia de Irineu centram-se nisto: Deus faz em Cristo uma “recapitulação” (anankefaláiosis); é a mesma ideia expressa por São Paulo (na Carta aos Efésios): Deus refaz o seu primitivo plano de salvar a Humanidade no seu Filho encarnado, que se converte, assim, no segundo Adão. Há, pois, uma nova criação da Humanidade; o segundo Adão retomou a antiga luta com o diabo e a venceu.
No capítulo que corresponde à Mariologia, a Humanidade recebe um novo progenitor que ocupa o lugar do primeiro Adão. Mas como a primeira mulher também estava comprometida coma queda pela sua desobediência, a cura começa também com a obediência de uma mulher. Dado vida ao Novo Adão Maria se faz verdadeira Eva; Maria torna-se uma “advogada de Eva” (“Advocata Evae”). Maria é o seio da humanidade pois ela é “mãe de todos os homens”.
No que diz respeito à Eclesiologia, Deus fez Cristo cabeça de toda a Igreja, de modo que resuma em si não só o passado, mas também o futuro, a fim de perpetuar, mediante a Igreja, a sua obra de renovação. A doutrina dos Apóstolos continua se mantendo sem alteração e essa tradição é fonte e norma da fé. Esse depósito da fé, para Irineu, parece ser o Credo batismal. Somente as Igrejas fundadas pelos Apóstolos podem ser apoio para o ensino autêntico da fé e testemunhas da verdade, já que uma sucessão ininterrupta dos seus bispos garantiza a verdade da doutrina. É por isso que aos hereges falta um requisito essencial.
Quanto ao primado de Pedro e Roma, Irineu frisa que é muito longa a enumeração de todos os bispos de todas as Igrejas. Por isso, reduz a sua enumeração à dos sucessores papais. Irineu de Lião oferece uma prova decisiva em prol da fé cristã contra os gnósticos: essa prova consiste na “liderança mais eficaz” que tem a Igreja de Roma sobre todas as outras, já que “a esta Igreja, efetivamente, em virtude da sua mais forte primazia, é necessário que corresponda ser a Igreja de todos os que em qualquer lugar forem fiéis, pois nessa Igreja sempre foi preservada a tradição desde os tempos dos Apóstolos”. Citando o texto original: “ad hanc enim Ecclesiam propter potentiorem principalitatem necesse est omnem convenire Ecclesiam, hoc est, omnes qui sunt undique fideles, in qua semper ab his qui sunt undique conservata est ea quae est ab Apostolis traditio”. Essa primazia da Igreja de Roma decorre, pois, do fato de ter sido fundada por Pedro e Paulo, dentro da sua sucessão episcopal e de acordo com a sua tradição.
Quanto à Sagrada Escritura, Irineu afirma que não há mais do que quatro Evangelhos, cujo número deriva da figura dos quatro querubins. Nela, o leão representa João e a águia Marcos. Os livros do Novo Testamento têm exatamente a mesma inspiração que os do Antigo Testamento e, portanto, são eles também Escritura (“Grafé”). A interpretação da Escritura pertence somente à Igreja.
No item referente à Antropologia, Irineu frisa: “Todos estão de acordo em que fomos formados de um corpo tirado da terra e de uma alma que recebe de Deus o seu espírito”. São três, pois, os componentes do homem: Fysis, Psyché, Nous (Corpo, Alma, Espírito). Dos atos da vontade e da conduta moral depende que seja recebida e conservada, ou não, a terceira parte, o Espírito. Ainda mais: como a Alma não é imortal por natureza, a existência eterna depende da sua conduta aqui na terra.
Doutrina sobre a salvação e os últimos tempos.
Cristo recapitulou, n’Ele, tudo e toda a humanidade. Fez a união com Deus e a adoção divina. Devolveu ao homem a sua semelhança com Deus. Trouxe esperança a todos os que precisam de redenção e a buscam. Irineu procura não suprimir os limites entre Deus e os homens, como pretendiam os pagãos e os gnósticos. A criatura atinge a sua perfeição através dos sacramentos os quais, junto com a Igreja, realizam a redenção do indivíduo. O sacramento é, para a natureza, o que o novo Adão é para o velho. As crianças podem, para salvar-se receber o batismo. Irineu é o primeiro que faz referência a este último ponto na literatura cristã.
3 – A Escola de Alexandria.
Alexandria foi o mais antigo centro das ciências sagradas na História cristã. O primeiro diretor dessa escola de catecúmenos de que se tem notícia é são Panteno, um estoico siciliano convertido ao Cristianismo e que, após uma longa viagem missionária à Índia, chegou em Alexandria por volta de 180, tendo falecido em 200. Seguiu-o na direção o seu discípulo Clemente de Alexandria (150-215), que foi sucedido por Orígenes (185-254), Dionísio (+265), Pierio (+309), Pedro Alexandrino (+311), Atanásio Dídimo 295-364) e Cirilo (375-444).
As características do ensino alexandrino são: a – o marcado interesse pela investigação metafísica do depósito da fé e b – a preferência pela filosofia de Platão (428-348) e pela interpretação alegórica das Sagradas Escrituras. Essas caraterísticas possibilitaram que a interpretação bíblica entrasse em contato fecundo com a filosofia grega, resolvendo o problema mais sério do cristianismo primitivo: a adequada exegese do Antigo Testamento.
4 – CLEMENTE DE ALEXANDRIA (150-215).
Assim como aconteceu com Justino, São Clemente (reconhecido como tal pela Igreja Ortodoxa) foi atraído à conversão pela elevação da doutrina de Cristo e a pureza da sua moral. Clemente, nascido em 150, era filho de pais pagãos e nasceu provavelmente em Atenas. Com a finalidade de obter um maior conhecimento do Cristianismo viajou pelo sul da Itália e também pela Síria e a Palestina até chegar em Alexandria, onde se tornou discípulo de Panteno, tendo passado a residir nessa cidade. Tornou-se assistente do seu mestre sendo escolhido, finalmente, como o sucessor deste, passando a ser o líder intelectual da comunidade cristã. Por volta do ano 202, a perseguição de Septimio Severo o expulsou do Egito. Refugiou-se, então, na Capadócia, tendo morado na casa do seu discípulo Alexandre. Viajou com ele a Jerusalém, onde Alexandre se tornaria bispo da cidade. Clemente morreu na Cidade Santa, em 215.
A obra de Clemente de Alexandria.
As pegadas dominantes do caráter de Clemente são a preocupação moral e o desejo de salvar as almas dos seus contemporâneos, por cima das preocupações temporais. Clemente é um grande mestre. No seu pensamento, o Cristianismo pela primeira vez se defronta com as ideias e as realizações da época. É considerado o pioneiro da ciência eclesiástica. A sua erudição era imensa, tendo cultivado com brilho a filosofia, a poesia, a arqueologia, a mitologia e a literatura, com perfeito conhecimento dos autores cristãos primitivos. Deve-se-lhe o fato de o pensamento filosófico e a pesquisa científica terem aceitação na Igreja.
Clemente achava que toda ciência serve à Teologia. Os seus três escritos principais são: Protréptico, Pedagogo e Stromata. O primeiro, Protréptikos pròs Hellenas (Exortação aos Gregos) é um convite à conversão. Nele, o autor promete uma vida que conduz à satisfação dos mais profundos anseios humanos, porquanto anuncia redenção e imortalidade. O livro é como uma das primeiras apologias cristãs. Já Clemente não julgava necessário defender o Cristianismo das falsas acusações e calúnias. O autor confere à sua polêmica um tom de convicção soberana, uma tranquila certeza acerca da função educadora do Lógos ao longo de toda a história humana. A sua intenção era entusiasmar os seus leitores com a única verdadeira filosofia, a religião cristã.
O Paidagogós (Pedagogo) continua o tema desenvolvido na obra anterior. Dirige-se aos que, seguindo o conselho da obra converteram-se ao Cristianismo. O Lógos torna-se presente na sua obra educadora. Frisa a respeito: “No Batismo somos iluminados; ao sermos iluminados, tornamo-nos filhos; pelo fato de sermos filhos tornamo-nos perfeitos; sendo perfeitos nos tornamos imortais”. O princípio básico da educação que o Lógos confere aos seus filhos é o amor. Mas Deus é, ao mesmo tempo, bom e justo e um mestre entendido sabe misturar a bondade com o castigo. O temor é bom porque impede cair no pecado. O Tratado logo pasa a se ocupar com os problemas da vida diária: comida, bebida, casa e móveis, música e dança, diversões, banho e perfumes, urbanidade e vida matrimonial. Em tudo isso o que importa é a atitude da alma. O mais importante é que a vida cultural da cidade se impregne do espírito cristão. O Pedagogo termina com um hino a Cristo salvador, hino que talvez constituísse a oração oficial de louvor da Escola de Alexandria.
Os Stromateis (Os Tapizes) compreende oito livros e pertence ao gênero literário chamado de “tapizes”, semelhante à “pradaria”, “os banquetes”, bem como ao ”favo de mel”, gêneros preferidos pelos filósofos de então, pois permitiam tratar das mais variadas coisas sem ter de se submeter ao um plano rigoroso. Os mais diversos temas ficavam entrelaçados na obra como as cores de um tapiz.
Clemente estuda neles, Principalmente, as relações da religião cristã com a ciência secular. O autor escreve a respeito: “A filosofia é um dom de Deus; foi concedida aos Gregos pela Divina Providência”. Clemente vai além de Justino. Enquanto este falava da presença de sementes do Lógos na filosofia dos Gregos, Clemente compara a filosofia grega com o Antigo Testamento, porquanto é uma preparação da Humanidade para a vinda de Cristo. Coloca, no entanto, especial interesse em anotar que a filosofia, contudo, não poderá nunca substituir a Revelação; ao conhecimento de Deus, efetivamente, só se chega pela fé. A perfeição moral, que consiste na castidade e no amor a Deus, é o traço característico do gnóstico ideal, que contrasta claramente com o gnóstico herético.
Teologia de São Clemente alexandrino.
Clemente é o fundador da Teologia Especulativa. Esta constitui a harmonia da fé e do conhecimento que dá vida ao perfeito cristão e ao verdadeiro gnóstico. A idéia do Lógos será a base do sistema de Clemente. O Lógos é o criador do Universo e é Ele quem revelou Deus no Antigo Testamento, na Filosofia Grega e na Plenitude dos Tempos, na Encarnação. Com o Pai e o Espírito Santo forma a Trindade divina. Não se pode conhecer Deus senão através do Lógos, pois o Pai é inefável. O Lógos é, por essência, o Mestre do mundo e o Legislador da Humanidade. O Lógos é o Salvador da raça humana e o fundador de uma nova vida que começa com a fé, avança em direção à ciência e à contemplação e, através do amor e da caridade, conduz à imortalidade e à deificação.
Eclesiologia.
Há um só Deus Pai, um só Verbo de Deus e um só Espírito Santo. Assim, também há uma só Igreja universal. Clemente dá a esta Igreja o nome de Virgem Mãe, aquela que alimenta os seus filhos com o leite do Verbo Divino. A Igreja é Esposa e Mãe do Mestre. Ela é a escola onde ensino o seu esposo, Jesus. A Hierarquia compreende Bispos, Presbíteros e diáconos; tal hierarquia é uma imitação da hierarquia angélica. Os anjos levam a Deus nossas orações, ou seja, conhecem os pensamentos dos homens. Clemente prepara assim o caminho para as teorias de Santo Agostinho. Os anjos não possuem sentidos, conhecem instantaneamente e com rapidez o pensamento. As Sagradas Escrituras são divinamente inspiradas.
Batismo.
Trata-se de um novo nascimento e de uma nova geração. O Batismo é selo (sfragís), iluminação, ato de lavar, perfeição e mistério. A respeito, frisa Clemente: “No Batismo somos iluminados; ao sermos iluminados, chegamos a sermos filhos; sendo filhos, tornamo-nos perfeitos; sendo perfeitos, nos tornamos imortais”. A Escritura afirma: “Eu disse: sois deuses. Sois filhos do Altíssimo” (Salmo 81).
Eucaristia.
São Clemente distingue claramente o sangue humano do sangue eucarístico de Cristo. Este sangue é denominado de “uma mistura da bebida e do Lógos”, cuja ingestão produz o efeito de santificar o corpo e a alma do homem.
Pecados e penitência.
Clemente está convencido de que somente um ato pessoal pode manchar a alma. Esta é talvez uma reação contra os gnósticos que sustentavam que a causa do mal é a matéria má. Deus, no entanto, na sua misericórdia, concedeu uma segunda penitência que não poderá ser obtida senão uma vez. Dessa penitência não se exclui nenhum pecado, mesmo que seja grande. Este será perdoado com a condição de que não haja obstáculo na alma. O pecado voluntário e irremissível consiste em que o homem se afaste deliberadamente de Deus e rejeite a reconciliação e a conversão.
Matrimônio e virgindade.
O matrimônio é muito necessário para a ordem moral e é um dever para o bem-estar da pátria, para a sucessão da família e para o aperfeiçoamento do mundo. É um ato de cooperação com o Criador. A propósito, Clemente frisa: “O homem converte-se em imagem de Deus na medida em que coopera na criação do homem, mas a procriação dos filhos não é o único fim do casamento: os esposos unem-se com um laço eterno pelo amor mútuo e pela ajuda e assistência que se prestam mutuamente”. Clemente pergunta: “Quem são os dois ou três reunidos em nome de Cristo em meio aos quais está o Senhor? Não são talvez o homem, a mulher e a criança, já que o homem e a mulher estão unidos em Deus?”
De outro lado, Clemente frisa: “Mas louvamos a virgindade e aqueles aos quais ela foi concedida pelo Senhor”. Clemente, não obstante, considera o casado superior ao solteiro. Não encontramos paralelo para essa opinião em nenhum outro escritor.
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